A ofensiva dos aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) contra os professores chegou a Campo Grande. O vereador Tiago Vargas (PSC) apresentou polêmico projeto de lei para exigir exame toxicológico anual dos cerca de 5 mil professores da rede municipal de ensino. Parlamentares bolsonaristas já apresentaram propostas com o mesmo objetivo em outros estados e na Câmara dos Deputados.
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A reação ao projeto na Câmara dos Vereadores da Capital foi imediata. Acusado de criminalizar a educação e de criar mais um obstáculo aos docentes da rede pública, o vereador não desistiu de levar a discussão em frente e até sinalizou em ampliar a polêmica. “Podemos ampliar para todos os servidores públicos, inclusive aos vereadores”, propôs o parlamentar.
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Pela proposta de Vargas, o exame toxicológico é obrigatório nas escolas municipais. Os exames serão realizados com periodicidade anual e previamente à admissão do professor como condição para ser empossado em concurso público ou processo seletivo. “A detecção do uso de droga ilícita caracteriza falta disciplinar, passível de aplicação de sanções diversas da demissão, dispostas na Lei Complementar 190, de 22 de novembro de 2011, devendo o professor ser encaminhado para tratamento”, prevê o projeto.
“A reincidência configura falta grave, passível de aplicação da pena de demissão, nos termos artigo 49, inciso III, da Lei Complementar 190, de 22 de novembro de 2011”, determina outro artigo.
“Não sou contra a educação nem quero criminalizar a educação”, reagiu Tiago, para justificar a proposta. Apesar da proposta prever a demissão dos docentes pegos no exame, o vereador diz que a intenção é ajudar os profissionais de educação com dependência química.
“Considerando esse fato, não é admissível que os profissionais do ensino possam ser, eles mesmos, dependentes de drogas ilícitas. Para um aluno, que vê no professor um modelo de pessoa, encontrá-lo sob o efeito de entorpecentes seria um trauma, ou até um estímulo para este comportamento danoso que ao descobrir poderia também, de alguma forma se sentir influenciado e/ou motivado a fazer uso de psicotrópicos”, justifica.
“É comum que algumas categorias profissionais precisem realizar periodicamente exame toxicológico, porquanto suas atividades seriam incompatíveis com o uso de drogas ilícitas. E no presente caso, verifica-se a importância de se realizar o exame, em razão da extrema importância do professor na formação e desenvolvimento do aluno”, explicou.
No entanto, a proposta teve reação contundente dos vereadores. “Quero demonstrar repúdio a este projeto, que praticamente marginaliza os profissionais da educação, que mostra total falta de empatia com nossos professores, lembrando que o dom de ensinar vai muito além da sala de aula, é feito com amor”, afirmou o Professor Riverton (DEM), conforme o Midiamax.
“Temos consenso que não passa, não tem lógica”, garantiu o Professor Juari (PSDB), que foi superintendente na Secretaria Estadual de Educação. Ele destacou que os professores se reinventaram na pandemia para garantir a continuidade das aulas enquanto os alunos ficaram em casa, trabalhando muito além da jornada de oito horas.
Do mesmo partido de Tiago, o vereador Valdir Gomes também condenou a polêmica proposta. “Eu, que venho de sala de aula, sei a dificuldade. Eu acho que, no momento, temos que trazer projeto para aluno. Temos que colocar contraturno, temos que brigar pela situação da escola”, defendeu. Ele classificou a proposta como “inoportuna”.
Ex-presidente da Câmara Municipal, João Rocha (PSDB), também rechaçou o projeto. “Então, todos deveriam passar. O professor precisa ser olhado com atenção, com cuidado, diferente de ser policiado, não é esse o foco, estamos mudando o viés. Com a base da família e informações vindas da escola, você forma o cidadão, vamos melhorar as condições de trabalho”, propôs o tucano.
“Sou fruto da educação pública, posso dizer que, se estou nesta Casa de Leis, é porque teve muita contribuição dos meus mestres, que perderam noites pra nos fornecer caminho diferente. O profissional da educação tem que ser o mais valorizado”, afirmou Betinho (Republicanos).
A proposta de Tiago Vargas se transformou em bandeira dos bolsonaristas contra os professores, críticos do atual Governo. O deputado federal Marcelo Brum (PSL), do Rio Grande do Sul, apresentou projeto para realizar exame toxicológico anual em todos os professores da rede pública do Brasil.
No mesmo sentido, o deputado federal Hélio Lopes (PSL), amigo de Bolsonaro, quer realizar o exame toxicológico em todos os trabalhadores que atuam diretamente nas escolas, como administrativos, seguranças, policiais e professores.
Na semana passada, a Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia de Pernambuco aprovou por 5 a 1 o projeto de lei com o mesmo objetivo do deputado estadual Alberto Feitosa (PSC). A proposta que obriga o exame toxicológico nos professores da estadual pernambucana vai a plenário nos próximos dias.
Embora há pesquisa apontando o uso de drogas ilícitas entre estudantes, não há registro de casos nem ocorrências envolvendo professores. O projeto de Tiago Vargas vai criar mais um transtorno na vida do profissional da educação pública, que não recebe um salário digno e ainda vai ser penalizado com o pagamento de taxa para fazer o exame todos os anos para garantir o sustento da família.
A educação não se faz com ataque aos professores.