O passaporte da vacina se transformou no novo round entre a população, profissionais de saúde, cientistas e bolsonaristas. Depois da batalha com a economia, o grupo mantém-se no ataque, desta vez de que a liberdade do cidadão, de não se imunizar contra a covid-19, é mais importante do que a vida. O maior exemplo do acirramento dos ânimos foi a audiência pública na Câmara Municipal de Campo Grande, que por pouco não terminou em pancadaria e foi encerrada abruptamente.
[adrotate group=”3″]
Na Capital, a proposta para exigir o passaporte da imunidade foi apresentada pelos vereadores Camila Jara e Ayrton Araújo, do PT. Para obrigar a vacinação de 100% da população e barrar definitivamente o coronavírus, eles propõem que se exija o passaporte em eventos públicos, inscrições em concurso público e acesso aos estabelecimentos municipais.
Veja mais:
Resende chama bolsonaristas de “fascistas e nazistas” e tumulto encerra audiência pública
Nem no TJ deputado obtém dados sobre gastos de Reinaldo com propaganda da covid
Só dois deputados assinam CPI para investigar Reinaldo por aplicação de recursos da covid-19
Na contramão, o vereador Tiago Vargas (PSD) e o deputado estadual Capitão Contar (PSL) apresentaram projeto de lei proibindo a instituição do passaporte da vacina. Fieis ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), eles encamparam a proposta defendida pelos conservadores e pelos movimentos de direita no Estado.
“Até o momento não há comprovação de que a vacina previne a transmissão. Vacinado ou não, o indivíduo pode contrair e transmitir o vírus. A vacinação de uma pessoa não depende da vacinação de outra para ter eficácia. Não podemos discriminar nossos cidadãos. Exigir um ‘passaporte sanitário’ como condição para que o cidadão exerça o direito de ir e vir, desrespeita a Constituição Federal e a garantia de liberdade aos brasileiros”, justificou-se Contar.
Tiago classificou a proposta como “absurda”. “Sou contra a obrigatoriedade, mas não sou contra a vacina, até tomei as duas doses”, afirmou o vereador, que perdeu a mãe, Mercedes Vargas para a covid-19. Ele disse que a exigência é “ditatorial”.
Enquanto Campo Grande discute, a exigência do passaporte da vacina já é realidade em 249 cidades, sendo 14 capitais. Rio de Janeiro exige o documento desde o dia 15 em praticamente todos os acessos públicos, enquanto São Paulo cobra desde o dia 1º.
“O passaporte da vacinação é uma medida sanitária, de cuidado coletivo, utilizada pelos municípios com o objetivo de garantir o maior número de cobertura vacinal, assim como das pessoas que acessam as cidades, e a consequente redução na circulação do vírus. Importante destacar que nós não temos vacinação forçada no Brasil. O cidadão tem a liberdade de não vacinar. Isso não significa que não se traga a ele consequências dessa decisão”, afirmou Paulo Ziulkoski, presidente da CNM (Confederação Nacional dos Municípios).
Para o vereador Ayrton Araújo, o passaporte da vacina é uma medida para não liberar geral para sofrer as consequências no futuro. “Criamos o passaporte da vacina para quem se vacinou e precisa de proteger, para não ser infectado novamente”, explicou o petista.
De acordo com o coronel do Corpo de Bombeiros, Marcello Fraiha, assessor da Secretaria Estadual de Saúde, defendeu a exigência. “Não queremos mais mortes”, ressaltou. Ele alertou que os não vacinados possuem 11 vezes mais risco de ir a óbito.
“Os 15% que não se vacinaram não têm direito de colocar em risco a vida de todo mundo”, afirmou o deputado estadual Amarildo Cruz (PT), manifestando-se a favor do passaporte da vacina. Ao rebater os bolsonaristas, ele destacou que a vida, como direito na Constituição, prevalece sobre a liberdade.
A Fetems (Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul) defende a implantação do passaporte da vacina. De acordo com a secretária geral, Sueli Veiga Melo, a entidade apoia tudo que vir para superar a covid-19. “(O passaporte da vacina) é bem-vindo porque a covid mata e deixa sequelas”, justificou. “Se não tomar a vacina, tem liberdade, mas fique em casa”, aconselhou.
Já os empresários são contra a vacina. De acordo com a representante da Associação Comercial e Industrial de Campo Grande, Juliana Varanda, o passaporte fere direitos e a liberdade. “Já sofremos muito com a pandemia”, justificou-se a empresária, citando que falava em nome de 8 mil empresas.
O vereador Professor André (Rede) defendeu o passaporte da imunidade porque a vacinação da população pode diminuir o risco de cepas mais graves. “A vacina só vai atingir o efeito social quando a população estivar totalmente imunizada”, avisou o parlamentar, que é professor da UFMS (Universidade Federal) há 30 anos e tem doutorado em doenças tropicais.
Como exemplo, André falou da tuberculose, que ainda registra 45 mil casos por ano no Brasil. No entanto, conforme o parlamentar, poucas pessoas morrem em decorrência da doença devido à imunização, que é obrigatória para as crianças.
Médico e bolsonarista, Dr. Sandro Benites (Patri) é contra a obrigatoriedade da vacinação contra a covid-19, apesar da imunização de crianças ser obrigatório para várias enfermidades, como coqueluche, varíola, sarampo e poliomielite. “Sou contra qualquer ditadura, mas a favor da vacinação massiva”, defendeu o parlamentar.
Camila Jara ressaltou que vivemos uma cenário com guerra, com tantos doentes e mortos. Ela lembrou que quase 10 mil perderam a vida para a covid-19 no Estado. “O Rio elevou em 20% o número de vacinados com o passaporte da vacina”, contou a petista.
Para sensibilizar os bolsonaristas, a jovem vereadora recorreu a um tema caro ao grupo, o aborto. Os conservadores são contra qualquer tipo de interrupção da gravidez, inclusive os legais, como em caso de estupro e de risco para a saúde da mãe. “O direito à vida é perpétuo e só pode ser garantido com vacinação”, ressaltou.
A coordenador do grupo QG Voluntários do Bolsonaro, Sirlei Faustino Ratier, defendeu a vacinação, mas se posicionou contra o passaporte porque não se pode obrigar todo mundo a se imunizar. Como exemplo do efeito da vacina, a bolsolnarista citou a erradicação da paralisia infantil e da varíola com a imunização em massa.
No entanto, no caso da covid-19, Sirlei citou dados divulgados pelo Metrópoles, de que 17 mil brasileiros morreram da doença, mesmo tendo sido imunizado com as duas doses. Na sua avaliação, a vacinação de 60% a 70% da população pode causar a imunização de rebanho, suficiente para frear a pandemia.
Em meio à polêmica e guerra política, você gostaria de frequentar um lugar com todo mundo imunizado ou de correr risco de ser contaminado pela primeira vez ou novamente só porque a minoria decidiu ignorar a ciência e não tomar nenhuma das vacinas disponibilizadas gratuitamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde)?
A decisão é de cada um, mas o risco será de todos.