O Ministério Público Estadual denunciou o desembargador aposentado Paulo Alfeu Puccinelli por enriquecimento ilícito e ter recebido vantagens indevidas para furar a fila do precatório e determinar o pagamento de R$ 25,564 milhões ao empresário Jamil Name. Na época, ele era vice-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. O magistrado pode ser condenado a pagar R$ 16,320 milhões aos cofres públicos.
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A ação contra Puccinelli foi protocolada no dia 9 de fevereiro deste ano pelo promotor Adriano Lobo Viana de Resende. Conforme a denúncia, o desembargador aposentado não comprovou a origem do depósito de R$ 635,6 mil entre 2009 e 2010 e o acréscimo patrimonial de R$ 607 mil. A promotoria pede o ressarcimento de R$ 9,7 milhões, que foram pagos ao empresário acusado de liderar um grupo de extermínio, multa civil de R$ 3,9 milhões e indenização por danos morais de R$ 1,323 milhão.
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O escândalo ocorreu em julho de 2009. Na época, Paulo Alfeu Puccinelli, vice-presidente do TJMS, acatou pedido da defesa de Jamil Name e, sem respeitar a ordem cronológica, determinou o pagamento do precatório de R$ 25,564 milhões. A liminar foi concedida no dia 10 de julho de 2009. Três dias depois, a prefeitura da Capital, na gestão de Nelsinho Trad (PSD), firmou acordo com Name para pagar R$ 18 milhões, sendo 13 parcelas de R$ 1,385 milhão.
Para “convencer” o magistrado a conceder a liminar, Name alegou a idade e grave problema de saúde. No entanto, ele acabou recebendo somente a primeira parcela de R$ 1,385 milhão. As demais prestações foram repassadas aos empresários e irmãos Jorge e David Haddad. O pagamento foi suspenso pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dip, em abril de 2010.
“Também importante destacar que o requerido ainda anuiu com a subsequente cessão de crédito de forma a beneficiar, com burla à ordem cronológica de apresentação de precatórios, os terceiros Jorge Haddad e David Haddad Neto, que sequer eram autores do malsinado pedido de ‘crédito humanitário’”, destacou o promotor.
A quebra do sigilo bancário revelou que Paulo Alfeu Puccinelli recebeu depósitos em dinheiro, sem origem comprovada, de R$ 80 mil no período em que o precatório foi negociado. Jamil Name pleiteou a liberação dos R$ 25 milhões no dia 6 de julho, quatro dias depois, Puccinelli recebeu o depósito de R$ 20 mil em dinheiro. No mesmo dia, 10 de julho de 2009, ele concedeu a liminar.
Adriano Lobo apontou outras coincidências. Dois dias após o acordo com a prefeitura, 15 de julho de 2009, o desembargador recebeu três depósitos de R$ 10 mil cada, que somaram R$ 30 mil. Ele homologou o acordo no dia 17. Três dias depois, o MPE identificou mais três depósitos de R$ 10 mil, que totalizam R$ 30 mil.
“Assim, conforme destaca a perícia, no interstício de 10 dias houve o depósito fragmentado de dinheiro sem qualquer relação aos seus vencimentos como agente público e sem origem declarada no total de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), exatamente no período da prática administrativa ilícita de quebra da ordem de precatórios. Ainda, importante registrar que nos meses subsequentes a perícia detectou vários depósitos em dinheiro, de menor valor e não identificados, na conta do requerido, em período contemporâneo à expedição pelo mesmo de alvarás para levantamento das parcelas do acordo acima referido”, acusou.
Conforme o MPE, entre 2009 e 2010, período em que foi responsável pelo setor de precatórios, o desembargador teve créditos de R$ 635,6 mil que não tinham vínculo com os vencimentos pagos pelo tribunal. Os salários do tribunal no período somaram R$ 953,1 mil. Do total depositado, R$ 467 mil não teve a origem identificada pelo MPE.
O inquérito foi aberto com base na investigação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Já o Tribunal de Justiça arquivou o inquérito há quatro anos. “Apesar de comprovada a ilegalidade na quebra da ordem cronológica no pagamento do precatório, como o investigado aposentou-se compulsoriamente por idade, a Sindicância foi arquivada na data de 28 de setembro de 2016, em razão da ‘extinção do vínculo funcional do sindicado com a administração pública e perda de objeto na esfera administrativa’”, pontuou o promotor, ao citar informação repassada pelo presidente da corte na ocasião, desembargador Divoncir Schreiner Maran.
“Em conclusão, o requerido atuou em improbidade administrativa ao praticar ato visando fim proibido em lei, atentatório aos princípios da administração pública e danoso ao erário, consistente em determinar administrativamente, com burla a ordem cronológica de apresentação dos precatórios, o sequestro e pagamento prioritário em favor de Jamil Name e, posteriormente, de Jorge Haddad e David Haddad Neto, do valor, sem correção, de R$ 25.564.605,64 (vinte e cinco milhões, quinhentos e sessenta e quatro mil, seiscentos e cinco reais e sessenta e quatro centavos)”, anotou o MPE.
Ao Ministério Público, o desembargador justificou os depósitos sem comprovação a empréstimos e recebimentos feitos com os filhos.
“Portanto, restou configurada, também, a improbidade administrativa de enriquecimento ilícito prevista no artigo 9º caput e inciso VII da Lei 8.429/92, porquanto o requerido, no mesmo período da ilegalidade destacada no item I, auferiu vantagem patrimonial indevida consistente em dinheiro cujo valor é incompatível com a renda do agente público, bem como revelou evolução patrimonial incompatível com os rendimentos do agente público”, concluiu o promotor.
A ação de improbidade administrativa vai ser julgado pelo juiz David de Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. Ele já analisou outro escândalo, o da desembargadora Tânia Garcia de Freitas Borges, que teria usado a influência e o prestígio para tirar o filho, o empresário Breno Fernando Solon Borges, da prisão após ser flagrado com 129 quilos de maconha e 270 munições de armas de uso restrito.
Tânia virou réu por improbidade, mas o Tribunal de Justiça decidiu arquivar a denúncia feita pelo MPE. No entanto, a magistrada acabou punida pelo CNJ a aposentadoria compulsória pelos mesmos fatos.
Outro caso é do juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior, da 5ª Vara da Família e Sucessões de Campo Grande. Ele é acusado de corrupção, venda de sentença e organização criminosa. Em uma das ações por improbidade, David Gomes Filho determinou o bloqueio de uma fortuna do magistrado.
Outro escândalo envolvendo o TJMS é do desembargador Divoncir Schreiner Maran, que concedeu habeas corpus ao narcotraficante Gerson Palermo, condenado a mais de 125 anos de prisão. Após ser solto, o criminoso quebrou a tornozeleira e fugiu.