A posse e o polêmico discurso do novo presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador Carlos Eduardo Contar, continuam repercutindo no Estado e no País (veja aqui). Em tom indignado, o magistrado detonou a cobertura da mídia sobre a covid-19, que chamou de “louvor ao morticínio” e de espalhar “mentira global”. Sem citar nome, ele chamou o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), de “picareta”, e defendeu o tratamento precoce, mesmo sem comprovação científica.
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Apesar do magistrado sul-mato-grossense receber o 2º maior salário do País, conforme o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ele cobrou do governador Reinaldo Azambuja (PSDB) mais recursos para o Poder Judiciário. “Se não houver real compreensão quanto a indispensabilidade dos serviços, de nada valerão obras de infraestrutura, saúde, segurança pública, educação ou qualquer outra, uma vez que no surgimento dos conflitos de interesse não haverá solução adequada em tempo hábil e em condições mínimas de apaziguamento”, argumentou.
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Diante da maior crise econômica da história de Mato Grosso do Sul, o presidente do TJ também pediu ajuda ao presidente da Assembleia Legislativa, Paulo Corrêa (PSDB), para aprovar a nova tabela dos serviços oferecidos pelos cartórios extrajudiciais. “É preciso que seja feito na aprovação da nova tabela de emolumentos e na de custas que também há de ser encaminhada, bem como na criação ou extinção de serventias, cargos e remunerações, dentre outros”, anunciou.
No entanto, a maior repercussão ocorreu com relação a pandemia. Mesmo diante do pico da doença no Estado, com 2.770 mortes e mais de 155 mil infectados, o tribunal reuniu 300 pessoas no Centro de Convenções Rubens Gil de Camillo. Decreto municipal limita eventos com 80 pessoas na Capital.
“Quanta tristeza! Quanta vergonha! Quanta revolta!”, disse Contar, sobre o momento atual enfrentado pela humanidade. “Este seria o momento de falar sem ser interrompido, é a oportunidade de considerar as coisas como se apresentam, combatendo a histeria coletiva, a mentira global, a exploração política, o louvor ao morticínio, a inadmissível violação dos direitos e garantias individuais”, acusou, fazendo referência à cobertura dos meios de comunicação.
Em seguida, ele defendeu o polêmico tratamento precoce, que incluí o vermífugo e a cloroquina, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). “O combate leviano e indiscriminado a medicamentos que – se não curam, e isto jamais fora dito – podem, simplesmente no campo da possibilidade, ajudar na prevenção ou diminuição do contágio, mesmo não sendo solução perfeita e acabada”, destacou o desembargador. De acordo com pesquisas científicas, a cloroquina não cura a covid-19. Além disso, o medicamento pode agravar problemas cardíacos.
“Porém, como já dito ao início, razões de ordem prática recomendam meu silêncio. Primeiro, para não ser penalizado, neste tempo de caça às bruxas onde até o simples direito de manifestar qualquer opinião que não seja a da grande mídia corrompida e partidária, também porque a idade vai ensinando que melhor do que estar certo é ser feliz, mesmo que padecendo com a revolta, a indignação e o inconformismo, e por último, também porque, já me alongo nesta fala e não gostaria de deixar a má impressão de ser inconveniente”, afirmou.
Carlos Eduardo Contar criticou com veemência as recomendações feitas no início pelo Ministério da Saúde, sob o comando do médico campo-grandense Luiz Henrique Mandetta. Ele não citou o nome do ex-secretário.
“Voltemos nossas forças ao retorno ao trabalho, deixemos de viver conduzidos como rebanho para o matadouro daqueles que veneram a morte, que propagandeiam o quanto pior melhor, desprezemos pois o irresponsável, o covarde e picareta da ocasião que afirma ‘fiquem em casa’, ‘não procurem socorro médico com sintomas leves’, ‘não sobrecarreguem o sistema de saúde’”, condenou.
“É, paciência senhores, os tempos realmente são estranhos”, ponderou, sobre os tempos atuais, em que os brasileiros se dividem sobre a forma de combater o desconhecido, o SARS-COV 2. A respeito, ele fez a seguinte análise: “certo é que uma simples observação do universo e, em particular do nosso país, faz emergir o pior da natureza humana através de muitos dos chamados ‘representantes do povo’, bem assim da magistratura em nosso país”, pontuou.
Ao longo do discurso, Contar citou o sermão da Montanha, feito por Jesus e relatado nos evangelhos. “Não existe justiça se houver omissão ou indiferença contra arbitrariedades, desvios, crimes, violência ou usurpação de direitos e liberdades individuais e coletivas. Compete ao Judiciário levantar sua voz, sua força e seu poder, longe de ideologias políticas contaminantes, ainda que alguns tresloucados que agem em seu nome façam o contrário, porquanto a verdadeira Justiça há de trazer o equilíbrio e a verdade, e não a propaganda pessoal, muito menos a atuação político-ideológica”, defendeu.
“Mato Grosso do Sul prima pela retidão dos seus magistrados, pessoas que escolheram esta terra e aqui exerceram e exercem com denodo e competência as atribuições dos cargos ocupados. Juízes de Direito e Desembargadores sempre caminharam na melhor direção e, se aqui ou acolá, este ou aquele desviou-se de seu mister, tais faltas – felizmente tão isoladas – apenas servem como exceção para confirmar a regra”, afirmou.
As exceções à regra podem ser os casos do juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior, denunciado por cobrar propina em troca de sentenças, ou da desembargadora Tânia Garcia de Freitas Borges, afastada do cargo por suspeita de usar o prestígio para defender o filho, Breno Fernando Solon Borges, preso com drogas e munições de fuzil, e de intervir em ações judiciais.
“Precisamos recolocar o Poder Judiciário sul-mato-grossense na vanguarda da justiça nacional, modernizando seu funcionamento, investindo em qualificação pessoal, reconstruindo a imagem de competitividade, agilidade, correção, orgulho e entusiasmo”, defendeu.
Veja o discurso na íntegra
História – Novo presidente do TJMS, Carlos Eduardo Contar é natural de Campo Grande e iniciou a carreira como auxiliar e técnico judiciário. Em 1986, ele foi aprovado no concurso público para promotor de Justiça. Em 2001 foi promovido a procurador de Justiça.
Em 2007, na vaga correspondente ao quinto constitucional reservado ao MPE, ele foi nomeado desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Ele sucedeu o desembargador Paschoal Carmello Leandro na presidência do TJMS.