O frigorífico da JBS em Campo Grande não abateu nenhum boi, mas pagou aproximadamente R$ 40 milhões em notas fiscais frias ao grupo do governador Reinaldo Azambuja (PSDB). O valor representa a maior parte da suposta propina de R$ 67,7 milhões paga ao tucano em troca de incentivos fiscais, conforme conclusão do inquérito 1.190 em junho deste ano pela Polícia Federal.
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Detalhes da investigação começaram a ser divulgados na terça-feira (22) pelo jornal Midiamax. O Jacaré também teve acesso aos detalhes do inquérito concluído pela Dicor (Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado) da PF em Brasília. Agora, o procurador-geral da República, Augusto Aras, pode denunciar as 22 pessoas ao Superior Tribunal de Justiça, pedir mais diligências ou determinar o arquivamento por falta de provas.
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A conclusão da PF contradiz a principal linha de defesa dos pecuaristas, de que teriam entregue o gado para o abate no frigorífico, como o primeiro secretário da Assembleia Legislativa, Zé Teixeira (DEM), o conselheiro do Tribunal de Contas, Márcio Monteiro, e do ex-deputado estadual Osvane Ramos. Eles chegaram a ser presos na Operação Vostok em 12 de setembro de 2018.
O Serviço de Inspeção Federal do Ministério da Agricultura e Pecuária fez perícia em 16 notas do pecuarista Élvio Rodrigues, de 30 do delator da Operação Lama Asfáltica, Ivanildo da Cunha Miranda, e 41 do empresário João Roberto Baird, o Bill Gates Pantaneiro. A devassa concluiu que não os bovinos apontados nas notas e nas GTAs (Guias de Transporte Animal) não foram abatidos na unidade da JBS.
Dois gerentes do frigorífico prestaram depoimento e corroboram com a delação premiada do executivo da multinacional, Valdir Boni. Eles contaram que pagavam as notas fiscais sem receber o gado.
O gerente U.S. contou que sabia que o gado não era entregue, mas havia o acordo de que o valor era reembolsado pela administração central de São Paulo. As notas encaminhadas por Baird variavam de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões. Teve dia em que o gado de papel superava a capacidade diária de abate do frigorífico, de 1,2 mil cabeças.
Antônio Celso Cortez revelou que chegou a entregar envelopes com as notas de Baird. Ele “adquiriu” as empresas de informática fundadas pelo Bill Gates Pantaneiro, como Itel Informática e Mil Tec Tecnologia.
Em depoimento à PF, Baird teria admitido que parte das notas eram frias e eram pagas sem a entrega do gado. Ele confirmou que o pagamento era feito em sua conta pessoal. No entanto, o empresário tentou inocentar o governador. Ele disse que não teria repassado nada a Reinaldo.
“Podemos concluir que a falsidade dessas notas está robustamente evidenciada nos autos”, concluiu o delegado Leandro Alves Ribeiro. Ele indiciou o governador e o filho, o advogado Rodrigo Souza e Silva, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Outras 20 pessoas foram indiciadas por integrar o esquema criminoso de pagamento de propina pela JBS em troca de incentivos fiscais.
O relator do inquérito no STJ é o ministro Felix Fischer. A família do governador está com os bens bloqueados desde 2018. A Operação Vostok completou dois anos no dia 12 de setembro deste ano.
A divulgação do resultado do inquérito foi bastante contestada por Reinaldo. “Trata-se de denúncia antiga, baseada em delações premiadas sem qualquer credibilidade e provas, que vêm sofrendo, em casos diversos no País, inúmeros questionamentos judiciais quanto à sua procedência e consistência”, minimizou o tucano.
O desfecho do escândalo é imprevisível. O afastamento do governador do Rio de Janeiro, Wilson Wiltzel (PSC) pelo ministro Benedito Gonçalves, do STJ, acendeu o alerta em MS. Em 2018, Fischer pontuou que só não afastaria o governador sul-mato-grossense porque o MPF temia prejudicar a economia estadual.
Ao apresentar a denúncia, Aras pode solicitar o afastamento imediato do tucano. Ele também pode ser afastado caso a denúncia seja recebida pela Corte Especial do STJ. No entanto, houve mudança no entendimento em 2017, que beneficiou o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT). Ele virou réu, mas permaneceu no cargo. Ou seja, tudo pode acontecer nesta história.