O juiz Rodrigo Pedrini Marcos, da 1ª Vara Criminal de Três Lagoas, montou dossiê para reforçar a denúncia no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) contra o ex-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador Divoncir Schreiner Maran. O magistrado é investigado por ter concedido habeas corpus de madrugada no plantão judicial para soltar o narcotraficante Gerson Palermo.
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Condenado a 126 anos de prisão em regime fechado pelo tráfico internacional de drogas, de alta periculosidade e com ligações com o Cartel de Medelín e com a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), Palermo quebrou a tornozeleira oito horas depois e sumiu.
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A fuga do narcotraficante virou escândalo nacional e o CNJ instaurou procedimento administrativo para apurar a conduta de Maran. Para reforçar a investigação aberta pelo corregedor-nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, o juiz de Três Lagoas montou dossiê para reforçar a denúncia.
“Serão apontados fatos e juntados documentos, tão-somente com o intuito de subsidiar Vossa Excelência na regular apuração do ocorrido, que manchou de modo profundo e quase indelével a imagem do Judiciário de Mato Grosso do Sul e até deste E. Conselho”, pontuou Pedrini, na petição de 62 páginas encaminhada ao CNJ no dia 16 de junho deste ano. O Campo Grande News divulgou a história nesta quarta-feira e O Jacaré confirmou o teor da denúncia.
Experiente desembargador, Divoncir Schreiner Maran não pediu a opinião do Ministério Público Estadual nem exames médicos para atestar os problemas de saúde de Palermo. Pedrini pontuou que o magistrado passou a noite lendo a petição de 35 páginas e as 173 folhas de documentos anexados pela defesa.
O habeas corpus foi protocolado no final da tarde de segunda-feira (20) e concedido às 8h do dia 21 de abril deste ano, feriado de Tiradentes. “A partir de 17.04 passou a ser plantonista o reclamado, cujo período foi até o dia 23.04. Longos dezoito dias, após três períodos de plantão de três desembargadores titulares, é que o advogado do condenado ingressou com o Habeas Corpus”, observou o juiz, sobre a estratégia da defesa.
“No entanto, o reclamado concedeu a liminar considerando os fatos aduzidos pelo advogado como verdades absolutas, malgrado as omissões e inverdades propositais contidas na inicial, que visavam atenuar a situação do condenado e inflar as supostas ilegalidades do juízo de piso – o que será explicitado em tópico apropriado – que não passariam desapercebidos pela totalidade dos julgadores e tampouco pelo reclamado nos recursos e ações de competência originária que julga no TJMS, sendo um dos desembargadores mais técnicos e estudiosos nos casos em que é relator, mas que infelizmente não o fez neste caso pontual no último dia do plantão de Páscoa”, anotou o juiz. Só que o feriado era de Tiradentes.
Rodrigo Marcos cita duas jurisprudências do Tribunal de Justiça sobre supressão de instância, que foram relatadas por Divoncir Schreiner Maran. No total, conforme a petição, o desembargador analisou mais de 60 casos semelhantes, em que negou os pedidos porque suprimiam instância.
O caso de Palermo foi o único caso em que o ex-presidente do TJMS decidiu ignorar o fato, de que o habeas corpus não havia sido analisado pelo juiz da 1ª Vara de Execução Penal.
“Nada justificaria a fixação de prisão domiciliar para o paciente – como aconteceu com a liminar em Habeas Corpus proferida, que beneficiou o condenado multireincidente, extremamente perigoso, com vínculos fortes com cartéis de droga no exterior e com facções criminosas, com altíssimo poderio financeiro – no último dia do plantão de Páscoa, pois não havia argumentos razoáveis que excluíssem da apreciação ordinária do juízo de piso ou até do relator de uma câmara criminal o exame da questão, quando inexistia qualquer urgência ou fato novo a justificar a intervenção excepcional”, anotou o magistrado.
“Bastaria uma consulta ao SEEU para verificar quem que batia as portas ao término do dia do plantão de 21.04. Caso o reclamado não tem acesso a esse sistema por integrar uma câmara cível, era só digitar o nome do condenado em qualquer buscador da rede mundial de computadores para verificar quem era ele. Se não efetuou qualquer consulta e tampouco colheu parecer prévio do Ministério Público, como aduzir de que não havia alerta sobre a periculosidade de Gerson Palermo?”, questionou.
Em seguida, o juiz de Três Lagoas cita a longa ficha criminal de Palermo, que o levou a condenação a 126 anos de prisão. Em 1985, o narcotraficante foi preso na Operação Condor, da Polícia Federal de São Paulo, acusado de integrar o Cartel de Medelín – ele levava éter e acetona de Santa Catarina e trazia cocaína da Colômbia.
Em 1991, Gerson Palermo foi preso com 500 quilos de cocaína em Campinas (SP). No ano 2000, ele sequestrou o Boeing 737-2000 e roubou mais de R$ 5 milhões. Em 2007, ele foi preso com uma tonelada de maconha. Em 2017, a PF o prendeu na Operação All In, na qual chegou a sequestrar um aeroporto em Corumbá.
“É um caso em supressão de instância, quando em expediente normal o reclamado não a reconhece, sem oitiva prévia do Ministério Público e em plantão judicial quando o caso não era de plantão, em tempo ágil e em horário incomum que beneficiou um dos maiores traficantes de cocaína por meio aéreo do Brasil, com condenações por tráfico, associação para o tráfico, lavagem de capitais e de até sequestro e roubo de uma aeronave, a penas totais superiores a 126 (cento e vinte e seis) anos de prisão, em uma petição inicial de Habeas Corpus com omissões e inverdades propositais que foram aceitas como verdades absolutas pelo reclamado”, concluiu o juiz Rodrigo Pedrini Marcos.
O ministro Humberto Martins determinou que a reclamação seja juntada à sindicância aberta para apuar a conduta de Divoncir Scjhreiner Maran no CNJ.