O Governo do Estado demitiu, nesta sexta-feira (17), o investigador da Polícia Civil, Thiago Henrique Vargas, famoso por não ter medo nem papas na língua para criticar políticos e, principalmente, o governador Reinaldo Azambuja (PSDB). Ele já havia sido punido por fazer críticas ao então deputado federal Elízio Dionizio, que se apresentava como representante dos evangélicos, ao ser transferido de Campo Grande, onde residia, para Pedro Gomes, a 318 quilômetros de distância.
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Só que a punição não intimidou o policial, que manteve o tom crítico à classe política sul-mato-grossense. Em uma das manifestações, ele conclamou o governador e o secretário estadual de Justiça e Segurança Pública, Antônio Carlos Videira, o Carlinhos: “vamos tirar a bunda da cadeira dos gabinetes e vamos trabalhar pelo povo”. O que seria normal em qualquer país democrático, a crítica levou a abertura de um dos 12 procedimentos administrativos contra Vargas.
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Em outro, o “crime” cometido foi ter feito críticas ao tucano em grupo de WhatsApp da Polícia Civil de Pedro Gomes. “Polícia Civil se encontra abandonada” e “perseguição deste governador corrupto não tem limites” foram as frases que irritaram Reinaldo e levaram a abertura de outra sindicância. Em outra postagem, ele acusou o tucano de “não dar estrutura para a polícia”.
A Corregedoria da Polícia Civil abriu processo contra Thiago Vargas porque ele criticou o então ministro Carlos Marun, que chefiava a Secretaria de Governo na gestão de Michel Temer (MDB) e acabou ganhando o cargo de conselheiro da Itaipu. A gestão tucana achou gravíssimo ele veicular “acusações” contra o ministro Marun.
Outro procedimento foi aberto porque Thiago participou de protesto convocado pelo Sinpol (Sindicato dos Policiais Civis), no qual os policiais exigiam melhores condições de trabalho. De acordo com o procedimento, ele estava de licença médica e não poderia ter participado do protesto.
“Ao que parece, a Corregedoria da Polícia tornou-se órgão ‘jurisdicional’ de persecução, para apuração de fatos que atentem contra determinadas autoridades, o que causa espanto, seja pelo desvirtuamento do procedimento, seja pelo foro privilegiado dos políticos supostamente ofendidos. Se realmente as autoridades acima mencionadas houvessem se sentidas ofendidas, caberia a elas promover as medidas cíveis e eventualmente criminais cabíveis e não à corregedoria, que é órgão administrativo específico da Polícia Civil”, afirmou o advogado Heitor Miranda Guimarães, que ingressou com ação na Justiça em julho do ano passado para anular as sindicâncias.
“Destaca-se que todos os procedimentos acima mencionados foram instaurados para averiguação da conduta do requerente em razão de suas opiniões políticas, mas em nenhum deles ocorreu violação direta ou indireta aos preceitos legais contidos na Lei Complementar n.º 114/2005, que regulamenta a função e carreira do policial civil”, argumentou.
Em vídeo postado nas redes sociais, Thiago Vargas chorou ao falar da demissão. “Estudei muito, dediquei dois anos da minha vida para me tornar policial civil”, afirmou. “Não me arrependo nada do que eu fiz, faria tudo de novo”, ressaltou.
Ele ressaltou que a demissão ocorreu em decorrência das opiniões políticas. Vargas anunciou que deverá recorrer à Justiça junto com o Sindicato dos Policiais Civis. “Eu não foi demitido por corrupção”, ressaltou.
“É inadmissível que, em um estado democrático de direito, policiais civis que são formadores de opinião que defendem sua família e sua categoria por melhores salários venham a ser demitidos por opiniões contrárias à de governantes”, condenou o presidente em exercício do Sinpol, Pablo Rodrigo Pael.
“Foi um ato covarde do Governo do Estado que demitiu o policial Tiago Vargas. Tal ato nos faz acreditar em perseguição, já que muitos policiais civis também participaram dos protestos e opinam em redes sociais sobre política. Além disso, Tiago Vargas já havia sido transferido para o município de Pedro Gomes como forma e represália”, lamentou.
O presidente licenciado da entidade, Giancarlo Miranda, também viu perseguição e censura ao policial da parte do governador Reinaldo Azambuja. NO final do mês passado, o tucano acabou indicado pela Polícia Federal por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa no inquérito da Operação Vostok.
Em setembro do ano passado, o juiz Zidiel Infantino Coutinho, da 3ª Vara de Fazenda Pública de Campo Grande, negou pedido de liminar para suspender os procedimentos que levaram à demissão do investigador de polícia.
A situação chega a ser surreal, já que o sul-mato-grossense vive em uma democracia. Bom, pelo menos, parece que o direito não vale para todo mundo em Mato Grosso do Sul.
A assessoria da Sejusp não se manifestou sobre a demissão, assinada pelo secretário Antônio Carlos Videira.