O risco de dano irreversível levou a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul a suspender o desmatamento de 3,319 hectares para a construção do novo prédio da Secretária Estadual de Fazenda. Conforme acórdão publicado na sexta-feira (28), o empreendimento fica suspenso, pelo menos, até o julgamento do mérito da ação do Ministério Público Estadual, que pede a preservação dos 494 hectares de área do Complexo dos Poderes.
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O desmatamento foi suspenso graças aos votos dos desembargadores Fernando Mauro Moreira Marinho (relator) e Vilson Bertelli. O voto divergente foi de Marco André Nogueira Hanson, que considerou mais importante a decisão do Imasul (Instituto do Meio Ambiente) do que os alertas feitos por especialistas, institutos de pesquisas, MPE e ambientalistas.
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Marinho considerou o laudo apresentado pelo promotor Luiz Antônio Freitas de Almeida, de que a área vegetal a ser suprimida é local de reprodução de aves migratórias, o que é considerado de preservação permanente pela legislação brasileira.
“Vejo que os fundamentos lançados pelo recorrente são relevantes, já que trouxe, para embasar seu pedido, laudos técnicos e fotografias, além de estudos realizados no local em que ocorrerá a possível supressão arbórea, onde se verifica, em juízo de cognição sumária, que há necessidade de uma análise mais acurada dos possíveis impactos ambientais que poderão ser ocasionados pelas obras a serem realizadas na área do Parque dos Poderes”, destacou o desembargador.
“Gizo que os laudos técnicos juntados pelo agravante indicam, a princípio, que a supressão das áreas excepcionadas pela Lei Estadual n. 5237/2018 irá gerar perda de habitat para fauna e flora e a destruição de corredores ecológicos”, destacou.
Manifestações da sociedade, abaixo assinado contra o desmatamento e o movimento S.O.S. Parque sensibilizaram o magistrado. “Não se pode ignorar ainda que existe uma grande mobilização da população Sul-Mato-grossense contra o referido desmatamento, conforme notícias publicadas nas mídias locais, fatos que devem ser considerados, porque ao final toda obra pública deve realizada para o bem comum”, pontuou Fernando Mauro Moreira Marinho.
A mesma preocupação com a preservação do meio ambiente e da qualidade de vida dos moradores da Capital foi demonstrada pelo desembargador Vilson Bertelli. “Assim, uma vez evidente a ocorrência de dano ambiental em razão da realização de obra em área sem efetiva exploração dos possíveis reflexos dessa ação, a presente hipótese, além de configurar irreversibilidade de recuperação do meio ambiente, também se amolda ao juízo do mal maior e do direito mais forte”, analisou.
O magistrado considerou estudos de que o desmatamento poderá ampliar a erosão dentro do Parque Estadual do Prosa e os alagamentos na Capital. “Outrossim, ao se considerar a existência incontroversa de erosão próxima à nascente do Prosa, de forma a afetar a região do Parque dos Poderes e do Parque das Nações Indígenas, é preciso primar pela realização de estudo específico não apenas sobre os impactos, mas também de eventual resolução de futuros problemas de drenagem e ecossistêmicos a serem ocasionados em razão da realização de obra na área pretendida”, alertou Bertelli.
O desembargador aproveitou o voto para dar um puxão de orelhas nos deputados estaduais, que revogaram o tombamento do Complexo dos Poderes para ajudar o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) a manter o desmatamento. A mudança do legislativo não teria apresentado motivo.
“Nesse contexto, a superveniência do Decreto nº 619/19 revogando o anterior (que tratava sobre o início do processo de tombamento), sem justificativa e após a prolação da decisão interlocutória do Relator citando o processo de tombamento como impeditivo para a supressão da vegetação, poderia revelar aparente reação legislativa. Esclareço, o tombamento tem a finalidade de preservar, por meio da lei, bens de valor histórico, cultural, arquitetônico e ambiental em favor da população. A sua revogação depende de motivação, pautada no interesse público, o que não se evidencia na hipótese”, ensinou o desembargador Vilson Bertelli.
O placar contra o desmatamento no Parque terminou com o placar de 2 a 1 na turma. O voto divergente foi do desembargador Marco André Nogueira Hanson. Na avaliação o magistrado, a intervenção do Poder Judiciário, para garantir a preservação do meio ambiente, é grave lesão à ordem administrativa e deslegitima o Imasul.
“É dizer, a inferência de existência de verossimilhança da alegação de violação à legislação ambiental, mesmo em caso de obtenção de licença expedida pelo órgão técnico competente que ateste o contrário, causaria perplexidade, vez que descaracterizaria indevidamente a presunção de legitimidade advinda do ato administrativo próprio”, explicou.
Hanson ainda defende o desmatamento ao destacar que atividade humana produz danos ao meio ambiente. “Não é demais lembrar que qualquer atividade humana é apta à produção de danos ambientais, mas a ocorrência destes deve ser tolerada quando aptas a garantir um desenvolvimento sustentável, sob pena de paralisação e colapso da própria sociedade”, anotou o desembargador.
A frente Juristas pela Democracia defende que o desenvolvimento, mas acha que o Governo do Estado poderia construir o prédio da Secretaria de Fazenda em área já desmatada e acessível à população, considerando-se a dificuldade de acesso ao Parque dos Poderes. Ou seja, é possível conciliar o desenvolvimento mantendo a qualidade de vida e preservando o meio ambiente.
A escolha será da sociedade e as gerações futuras vão colher os resultados das decisões do presente.