Analista judiciária do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul virou ré por improbidade administrativa e falsidade ideológica em decorrência de integrar organização criminosa que falsificava documentos para estrangeiros obterem o passaporte brasileiro. A denúncia aponta que ela teria recebido vantagem indevida de R$ 37,9 mil em 2014.
[adrotate group=”3″]
A denúncia contra Samira Fincatti Ayoub foi aceita pelo juiz David de Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. “Nos parece que somente a instrução do processo é capaz de revelar se os fatos contrapostos pela defesa são reais, se são razoáveis e, posteriormente, se estes fatos, afastam ou não a natureza de improbidade que o Ministério Público reclama. Por estes motivos, recebo a inicial”, afirmou o magistrado em despacho publicado hoje (28).
Veja mais:
Juiz é alvo de operação, junto com o pai e a sogra, que apura venda de sentença por R$ 250 mil
Investigado por golpe milionário, juiz é afastado por suspeita de corrupção na Vara de Sucessões
Mulher de juiz, advogada é presa acusada de dar golpe de R$ 5,3 milhões em aposentado
Senador lamenta divulgação de documento apócrifo e cita decisões contra de desembargador
Nelsinho pagou R$ 2,2 milhões para desbloquear bens e sentença no TJ, diz documento
A investigação foi aberta pelo promotor Marcos Alex Vera de Oliveira a partir de investigação feita pela Polícia Federal em 2014. A fraude teria sido descoberta a partir da prisão em flagrante do chinês Amir Hayel Ali em 17 de outubro de 2014 em Ponta Porã. Ele teria pago R$ 37.929 para obter certidão de nascimento de brasileiro, que foi usada para obter CPF, RG, título de eleitor e certificado de reservista. O objetivo era obter passaporte brasileiro.
Para dar credibilidade à fraude feita pelo marido, Fadi Ayoub, Samira teria hospedado o chinês em sua casa e o levado para o local de trabalho, a 4ª Vara Cível de Campo Grande.
“Tem-se, portanto, que a prova testemunhal aliada a análise de dados obtidos a partir de quebra de sigilo bancário, bem como a interceptação da comunicação telefônica, revelam que a Requerida SAMIRAFINCATTI AYOUB, ao utilizar seu cargo público para emprestar credibilidade a empreitada criminosa perpetrada por seu esposo, chegando inclusive a receber em seu local de trabalho pessoas interessadas em adquirir documentos falsos, violou deforma deliberada os princípios que regem a Administração Pública, em especial os princípios da legalidade e moralidade administrativa”, pontuou Marcos Alex.
Para o promotor, ela violou os princípios da moralidade e legalidade da administração pública. Ele destacou também o crime de enriquecimento ilícito. Ele pede a condenação à perda dos R$ 37.929, multa civil de três vezes o valor (R$ 113,7 mil) e perda dos direitos políticos pelo período de oito a dez anos.
Na área criminal, a ação penal tramita na 5ª Vara Federal de Campo Grande e foi aceita no ano passado. “Presentes, a princípio, a prova da materialidade e indícios de autoria do delito, assim como os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, e inocorrentes qualquer das hipóteses previstas no artigo 395 do mesmo diploma legal, RECEBO A DENÚNCIA (fls. 468/489), com a retificação solicitada no verso de fl. 514, oferecida pelo Ministério Público Federal contra os acusados FADI AYOUB (nome falso FADY FARES TAHA), SAMIRA CANELLA FINCATTI (nome falso SAMIRA FINCATTI AYOUB), ANDRÉ LUIS CABRAL DE AMORIM (nome falso ANDRÉ ZAHRAN CABRAL AMORIM), LOESTER AMORIM DA SILVA, ALECXANDRO BATISTA CORREA e MOURACY VITÓRIO DE LIMA”, anotou o juiz.
No entanto, ele negou pedido para suspender Samira das funções no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. O juiz argumentou que os fatos ocorreram em 2014 e não há provas da continuidade da prática criminosa.
“Embora conste dos autos que AMIR e HACHEM estiveram no local de trabalho da denunciada (4ª Vara Cível de Campo Grande – MS), estes também permaneceram hospedados em sua residência e sabiam que esta era casada com FADI, responsável, em tese, pela obtenção da documentação. Portanto, não há qualquer indício que demonstre que o comparecimento ao local de trabalho de SAMIRA, a qual já era conhecida de AMIR e HACHEM, tenha auxiliado ou assegurado o sucesso da suposta prática criminosa, até mesmo porque, quando do acontecimento de tal fato, já haviam sido obtidas as certidões de nascimento ideologicamente falsas, estando em curso a obtenção dos demais documentos”, ponderou o magistrado.
Defesa de analista destaca que não há provas de improbidade nem enriquecimento
Os advogados de Samira Fincatti Ayoub rechaçam a acusação de improbidade administrativa, de enriquecimento ilícito e de participação no esquema de falsificação de documentos para estrangeiros.
A defesa destacou que não há descrição do ato improbo cometido pela analista judiciária do TJMS. “Nesse contexto, mostra-se evidente que condutas que não tem qualquer relação com o cargo exercício pela requerida, e sobre as quais ainda pende juízo instrução criminal e contraditório, são absolutamente inócuos para fins de viabilizar o ajuizamento de uma ação de improbidade administrativa, por se tratarem de fatos jurídicos absolutamente distintos, e que por isso mesmo não se confundem”, ressaltaram.
“Nesse contexto, não há falar em improbidade administrativa, visto que a conduta da requerida – receber pessoas em seu local de trabalho –não configura ilícito de qualquer natureza, seja ela cível, penal ou administrativa. Assim, antes de se analisar os elementos subjetivos que devem estar presentes para que se caracterize a improbidade, imperioso verificar a inexistência de ação ou omissão por parte da ré que caracterize qualquer ilegalidade”, observam.
“Quanto ao outro argumento lançado na inicial de que o fato da requerida ser servidora pública daria ‘maior credibilidade’ à suposta organização criminosa, igualmente se mostra fantasioso e distante da realidade, pois segundo a própria investigação criminal, a emissão de certidões falsas para estrangeiros se dava na cidade de São Gabriel do Oeste/MS, através do Cartório de Registro Civil, que não ostenta qualquer relação com o cargo público da requerida”, frisam, já que ela trabalhava na 4ª Vara Cível de Campo Grande.
“Por fim, não se revela qualquer ganho patrimonial por parte da requerida que demonstre eventual participação na suposta organização criminosa, pois conforme conclusão da própria investigação, a ré vive de forma compatível com seus rendimentos e de seu marido, o que igualmente afasta qualquer indício de improbidade”, concluem.
Os advogados apontaram que o marido usava a conta bancária da esposa e a irmã dele, que reside no Líbano, fazia depósitos eventuais.