A saída dos cubanos do programa Mais Médicos a partir do dia 25 deste mês poderá deixar aproximadamente 400 mil moradores sem assistência médica em Mato Grosso do Sul. Em retaliação às declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), Cuba decidiu rescindir a parceria com o Governo brasileiro e determinou o retorno de 8.332 médicos cubanos.
[adrotate group=”3″]
Em Mato Grosso do Sul, dos 205 médicos do programa, 114 são cubanos. Dos 707 mil moradores contemplados pelo programa Mais Médicos, criado em 2013 na gestão de Dilma Rousseff (PT), 393 mil são atendidos por profissionais da ilha caribenha.
Veja mais:
MS pode perder R$ 1,7 bilhão com reação de árabes à política externa de Bolsonaro
Apoiado por Reinaldo e juiz Odilon, Bolsonaro decide ficar neutro em MS
De técnica de André a negócios com a JBS, Tereza vira ministra de MS na era Bolsonaro
Dos 44 municípios atendidos, 39 são de pequeno porte. Onze médicos cubanos atendiam em reservas indígenas, outra área com déficit de médicos no Estado.
Os profissionais estrangeiros atuam nas unidades básicas de saúde e nos programas de Saúde da Família.
Conforme o governo cubano, os médicos começam a deixar o Brasil a partir do dia 25 deste mês e todos deverão estar na ilha até o Natal. A medida pode causar “apagão médico” no País, principalmente, nas áreas mais carentes, municípios distantes e reservas indígenas.
“A população vai perder muito. Os municípios têm problemas financeiros, folha de pagamento estourada. Se acontecer de termos de contratar médicos brasileiros, cada um poderá sair a um custo de R$ 20 mil mensais. Imagine o impacto para cada município pequeno que terá que contratar cinco médicos para manter o atendimento”, lamentou, em entrevista ao Midiamax, o prefeito de Bataguassu e presidente da Associação dos Municípios de Mato Grosso do Sul, Pedro Caravina (PSDB).
Com os cubanos, prefeituras conseguiram resolver um problema antigo: a falta de médico. Antes do Mais Médicos, municípios ficavam anos e até décadas sem profissionais, mesmo pagando salários altíssimos, de até R$ 50 mil.
“É um problema que sempre enfrentamos. Essas cidades, aldeias, comunidades distantes, ribeirinhas… Não despertam interesse dos médicos brasileiros. Então esperamos que o governo federal tome alguma providência, pois não podemos ficar desamparados”, alertou Caravina.
O fim da parceria com Cuba também preocupa a CNM (Confederação Nacional dos Municípios), que teme calamidade pública na saúde com a saída dos 8,3 mil cubanos. “Esses profissionais estão distribuídos em 2.885 Municípios, sendo a maioria nas áreas mais vulneráveis, como o norte do país, o semiárido nordestino, as cidades com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), as terras indígenas e as periferias de grandes centros urbanos”, pontua.
“Entre os 1.575 Municípios que possuem somente médico cubano do Programa, 80% possuem menos de 20 mil habitantes. Dessa forma, a saída desses médicos sem a garantia de outros profissionais pode gerar a desassistência básica de saúde a mais de 28 milhões de pessoas”, estima a CNM.
A saída de Cuba é um duro golpe para os municípios, que planejavam ampliar o programa para áreas com problemas na fixação e ausência de médicos.
O Ministério de Saúde Pública de Cuba informou que tomou a decisão em decorrência das “declarações ameaçadoras e depreciativas” de Bolsonaro.
“Condicionamos a continuação do programa Mais Médicos à aplicação de teste de capacidade, salário integral aos profissionais cubanos, hoje a maior parte destinados à ditadura, e à liberdade para trazerem suas famílias, infelizmente, Cuba não aceitou”, afirmou o presidente eleito, pelo Twitter.
“Além de explorar os seus cidadãos ao não pagar integralmente os salários dos profissionais, a ditadura cubana demonstra grande irresponsabilidade ao desconsiderar os impactos negativos na vida e na saúde dos brasileiros e na integridade dos cubanos”, justificou Bolsonaro, isentando-se da crise.
Cuba em números
- Em Cuba, há 25 faculdades de medicina (todas públicas), e uma Escola Latino-Americana de Medicina, na qual estudam estrangeiros de 113 países
- Desde a Revolução Cubana em 1959, foram formados mais de de 150 mil médicos no país.
- O país tem 161 hospitais e 452 clínicas para pouco mais de 11, 2 milhões de habitantes.
- A duração do curso de medicina em Cuba, como no Brasil, é seis anos em período integral. Depois, há um período de especialização que varia entre três e quatro anos. Pelas regras do sistema educacional cubano, só entram no curso de medicina os alunos que obtêm as notas mais altas ao longo do ensino secundário e em um concurso seletivo especial.
- Em Cuba há hoje 6,4 médicos para mil habitantes. No Brasil, esse índice é de 1,8 médico para mil habitantes.
- A taxa de mortalidade em Cuba é de 4,6 para mil crianças nascidas, e a expectativa de vida é de 77,9 anos (dados de janeiro de 2013). No Brasil, a taxa de mortalidade é de 14 para mil bebês nascidos (2016).
Os contratos dos médicos cubanos são assinados pelo Brasil com a OPAS (Organização Pan-americana de Saúde), que transfere o total dos salários para o Governo de Havana. Cuba fica com três quartos dos salários.
Os médicos cubanos podem ser encaminhados para atender na Rússia e até na Itália, governada pela extrema-direita.
O Conselho Federal de Medicina, que sempre foi contra o programa, sempre garantiu que o País tem médicos suficientes para atender a demanda, inclusive de municípios periféricos e carentes. No entanto, nunca houve mobilização para atender a demanda contemplada pelo Mais Médicos, principalmente, pelos cubanos.
Segundo o jornal Folha de São Paulo, mesmo com os cubanos, o Mais Médicos tinha déficit de 2 mil profissionais. Com a saída de mais 8,3 mil, o novo presidente terá o desafio de encontrar 10 mil médicos para evitar uma tragédia.