Quinze advogados deverão provar à Justiça que existiu o pagamento de R$ 300 mil a R$ 6 milhões por mês a políticos, desembargadores e a procurador de Justiça, conhecido como “Mensalão Pantaneiro”. O escândalo explodiu há oito anos na Operação Uragano, da Polícia Federal, e a apuração esbarra na resistência da Assembleia Legislativa em abrir os dados bancários.
Em gravação feita pelo jornalista Eleandro Passaia, o então primeiro secretário da Assembleia, Ary Rigo, denunciou o pagamento mensal de R$ 300 mil ao então chefe do Ministério Público Estadual, Miguel Vieira da Silva, de R$ 900 mil aos desembargadores do TJMS, de R$ 2 milhões ao governador André Puccinelli (MDB) e de R$ 6 milhões aos deputados estaduais. Os repasses seriam ilícitos.
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Apesar da gravidade das denúncias, houve falta de interesse e empenho dos órgãos fiscalizadores e de controle em desvendar o escândalo. Puccinelli chegou a ser reeleito no primeiro turno, com mais de 56% dos votos válidos.
Indignados com a história, 15 advogados ingressaram com ação popular e cobraram a quebra do sigilo do legislativo estadual. O juiz de primeira instância determinou devassa nas contas bancárias da Assembleia Legislativa. Apesar de defenderem publicamente a apuração, André e os deputados recorreram e conseguiram derrubar a liminar no recesso forense, entre o Natal e o Ano Novo.
Os advogados não desistiram da ação e travaram uma verdadeira guerra nos tribunais superiores. Somente em maio deste ano, a ação popular voltou a tramitar na 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos.
A Assembleia Legislativa pediu que a ação fosse junta a outras duas, inclusive uma impetrada por José Magalhães Filho, que já foi extinta sem o julgamento do mérito pelo Tribunal de Justiça.
O juiz Marcel Henry Batista de Arruda, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, rejeitou o pedido e destacou a recalcitrância da Assembleia em abrir o sigilo bancário, que deveria ser de interesse público. Ele ressaltou que os deputados lançaram mão de todos os recursos possíveis para evitar a quebra do sigilo pela Justiça.
O mais irônico, repetindo o gesto da classe política brasileira de jogar para a plateia, o legislativo argumenta, para evitar a manutenção da ação popular, de que os advogados deveriam pedir acesso aos dados bancários administrativamente. Se movem céus e terra para evitar a abertura das contas na Justiça, não fariam esse gesto republicano “administrativamente”.
Em despacho de 15 de outubro deste ano, o juiz excluiu o Tribunal de Justiça e o MPE da lista de réus na ação popular, porque os envolvidos são desembargadores e ex-procurador-geral de Justiça, não as instituições.
Marcel Henry ainda determino que compete ao grupo de advogados provar o repasse ilegal da Assembleia Legislativa ao Tribunal de Justiça, aos deputados estaduais, ao então governador e a Miguel Vieira. Eles também deverão comprovar o suposto dano ao erário.
O curioso é saber como os 15 advogados, que não possuem poder de polícia nem de investigação, vão reunir provas para corroborar com as denúncias feitas por Rigo em um vídeo gravado há cerca de oito anos?
O Jacaré conversou com o advogado Jully Heider de Souza Cunha há dois dias sobre a decisão do magistrado, mas não houve retorno até a publicação desta matéria.
André concluiu o mandato e só acabou preso, em 20 de julho deste ano, na Operação Lama Asfátlica. Rigo não foi reeleito e acabou se tornando réu por corrupção e organização criminosa em suposto esquema que desviou uma fortuna do Detran.
Miguel Vieira concluiu o mandato de chefe do MPE e é alvo de ações por improbidade administrativa, mas segue.
Os desembargadores são alvo do inquérito 704, que tramita em sigilo no Superior Tribunal de Justiça e está na fase final. Os deputados estaduais nunca foram importunados por qualquer investigação neste caso.
Todos sempre negaram o suposto “Mensalão Pantaneiro” e até Rigo recuou das denúncias gravadas em vídeo.