A soltura dos oito réus presos na Operação Fazendas de Lama em 19 de março deste ano criou uma “situação absurda e ilegal”, conforme despacho do presidente da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, ministro Alexandre de Moraes. Ao revogar a prisão preventiva determinada pela mais alta corte do País, em suas palavras, a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região promoveu “clara e ostensiva afronta à decisão do Supremo”.
[adrotate group=”3″]
O teor da decisão do ministro, determinando a prisão preventiva do ex-deputado federal Edson Giroto e do poderoso empresário João Amorim, foi divulgado ontem pelo jornal Campo Grande News. O Jacaré teve acesso ao documento com 13 páginas nesta quinta-feira.
Veja mais:
Desafiado pelo TRF3, Supremo revoga HC e manda prender Giroto, Amorim e mais seis
O retorno do grupo à cadeia tem potencial explosivo e pode ter até reflexo nas eleições deste ano, quando estarão em disputa 24 vagas de deputado estadual, oito de deputado federal, duas de senador e uma de governador. Giroto dispunha de prestígio político, condições financeiras e estrutura para retornar à Câmara dos Deputados antes da prisão.
A detenção é vitória do grupo formado por policiais federais, do procurador regional da República, Davi Macucci Pracucho, e de juízes substitutos que se revezaram nos despachos, como Monique Marchioli Leite, Fábio Luparelli e Ney Paes de Andrade. O trabalho começou há cinco anos, mas esbarrou no foro privilegiado e só deslanchou em julho de 2015, com a realização da primeira fase da Operação Lama Asfáltica.
Apesar de apontar o desvio superior a R$ 300 milhões, a operação não conta com força-tarefa nem estrutura semelhante à Lava Jato. O combate ao maior esquema de corrupção no Estado só prossegue graças aos esforços quase heroicos de alguns integrantes das corporações envolvidas.
Soltos, conforme despacho do ministro Alexandre de Moraes, Giroto e João Amorim, acusados de serem uns dos chefes da suposta organização criminosa, continuavam cometendo os crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens. Ele frisa que a “reiteração criminosa” ocorreu após a soltura determinada pelo ministro Marco Aurélio, em junho de 2016, e teria ocorrido até neste ano.
Para Moraes, o TR3 ignorou decisão final do Supremo, de que o grupo deveria continuar preso devido a alta periculosidade e para garantir a ordem pública.
No despacho, ele faz o relato cronológico das decisões. Em maio de 2016, a juíza Monique Marchioli Leite determinou a prisão preventiva de Amorim, de sua filha, a empresária Ana Paula Amorim Dolzan, e sua sócia, Elza Cristina Araújo Santos; de Giroto, de sua esposa, Rachel Portela Giroto, e do cunhado, o engenheiro Flávio Henrique Garcia Scrocchio; do ex-deputado Wilson Roberto Mariano de Oliveira, o Beto Mariano, e de sua filha, a média Mariane Mariano de Oliveira Dornellas.
As prisões foram ratificadas pelo TRF3 e pelo Superior Tribunal de Justiça. Somente em 21 de junho de 2016, o ministro Marco Aurélio concedeu habeas corpus a Amorim e estendeu o benefício aos outros sete.
Soltos, Amorim, Flávio e Giroto foram presos pela segunda vez na Operação Aviões de Lama. Eles venderam um avião que tinha sido sequestrado pela Justiça.
A segunda prisão foi revogada pelo desembargador Paulo Fontes, da 5ª Turma do TRF3, que alegou estar desrespeitando decisão do Supremo. Para aliviar, ele determinou o cumprimento de medidas cautelares.
Em dezembro do ano passado, o juiz Ney Gustavo Paes de Andrade, negou pedido para revogar as prisões preventivas e o grupo recorreu, novamente, ao TRF3 para que tivesse o mesmo benefício da segunda detenção – cumprir medidas cautelares.
Entre idas e vindas, o desfecho ocorreu no dia 19 de março passado, quando o TRF3 reviu a decisão do Supremo, que tinha determinado a prisão preventiva 13 dias antes, e concedeu habeas corpus.
No final de abril, a procuradora geral da República, Raquel Dodge, ingressou com reclamação para acusar o TRF3 de desrespeitar o acórdão do Supremo, que tinha determinado a prisão dos réus.
“O TRF-3, reexaminado os fundamentos jurídicos da 1ª prisão preventiva e com base nos mesmos argumentos que já haviam sido afastados pelo Supremo Tribunal Federal, ignorou a decisão final do HC 135.027 e, proferindo decisão diametralmente oposta, concedeu a ordem, criando uma situação verdadeiramente absurda e ilegal, em clara e ostensiva afronta à decisão do STF, que não pode ser admitida”, conclui Alexandre de Moraes.
A nova prisão só pode ser revista pelo próprio ministro ou pela turma, onde o placar de 4 a 1 foi desfavorável aos réus.
Caso se confirme a longa estadia dos quatro homens na cela 17 do Centro de Triagem, é grande o rumor de que a operação pode ter um segundo delator.
O primeiro foi o empresário Ivanildo da Cunha Miranda, que entregou provas e fechou acordo de colaboração premiada antes mesmo de ser preso. As suas revelações deram base à quinta fase da investigação, a Operação Papiros de Lama, que levou à prisão do ex-governador André Puccinelli (MDB) em novembro do ano passado.
A avaliação é de que uma segunda delação pode abrir a porteira e acender o sinal de esperança para a sociedade, cansada de escândalos sem punição.
Amorim diz que cumpriu de “forma exemplar” medidas cautelares
A defesa do empresário João Amorim tentou convencer o ministro Alexandre de Moraes a não decretar a nova prisão preventiva do grupo. Ele alegou que não houve desobediência à decisão do STF por parte do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
O dono da Proteco afirmou que “cumpriu de forma exemplar todas as medidas cautelares que lhe foram impostas pela Justiça”. As restrições substituíram a prisão preventiva no final de 2016.
Edson Giroto, Rachel, Beto Mariano e Flávio também argumentaram de que o STF não proibiu a concessão de novo habeas corpus. Ele destacaram que o momento atual é outro e já se passaram quase dois anos da primeira prisão preventiva.