Em Mato Grosso do Sul, as peripécias do personagem Odorico Paraguaçu, da novela O Bem Amado, ficaram no chinelo. O folclore do momento sacode Aquidauana, o portal do Pantanal. O prefeito Odilon Ribeiro, 41 anos, do PSDB, fez procuração em cartório delegando o “mandato” ao secretário municipal de Governo, Wezer Alves Rodrigues, o Wezer Lucarelli, 50 anos.
Conforme a polêmica procuração, publicada no Diário Oficial do município, Wezer passa a ter “poderes amplos, gerais ilimitados, irrevogáveis e irretratáveis” a frente da prefeitura. Os poderes não valem apenas para substituir a vice-prefeita, Selma Suleiman (MDB), mas, inclusive, na presença do chefe do Executivo.
Graças à procuração, o secretário passa a exercer o papel de chefe de governo e representante do município. O documento lhe transfere desde o simples papel de receber notificações até lançar licitações, exonerar e contratar funcionários, assinar contratos, dar ordens de serviços e emitir cheques em nome do município.
Para que não fique nenhuma dúvida, o encerramento da procuração é claro: “praticar todos os demais atos necessários e indispensáveis ao bom e fiel desempenho do presente mandato”.
Na prática, a cidade com 47,4 mil habitantes passou a ter um novo chefe, só que sem legitimidade eleitoral. Odilon foi eleito com 15.061 votos, que representa 62,43% dos votos válidos, em outubro de 2016.
Advogado, Wezer obteve 921 votos e foi o segundo vereador mais votado. Deixou o mandato para comandar a Secretaria de Governo na gestão de Odilon. Agora, graças à procuração celebrada em cartório na semana passada, passa a ter poderes de prefeito.
A vice-prefeita, esposa do ex-prefeito Fauze Suleiman, captou o espírito da outorga do colega de chapa. “O alcance dessa procuração é muito maior: o poder que o pode concedeu ao prefeito e à sua chapa através de uma eleição está sendo transferido para um secretário. A procuração não diz que ela valerá na ausência, na falta do prefeito. Em tese ela vale inclusive se o prefeito estiver na prefeitura”, observou no Facebook. Ela defende a revogação da procuração devido ao incomodo que causa na sociedade local.
De férias na praia, segundo o boato no município, o prefeito negou que tenha delegado todas as funções do mandato ao secretário. “Acredito que posso delegar algumas funções aos secretários, somente isso, jamais vou deixar de cumprir com o compromisso que assumi com meu povo”, afirmou.
Ribeiro considera “absurdo” a realização de algumas funções como prefeito. “Até pensão de filho de funcionário sou eu que assino, um absurdo”, exemplificou. Cita outros casos, como acordo judicial, que tomam muito tempo. “Ate empréstimo consignado”, frisa.
Ele também justifica a procuração para evitar a substituição do prefeito por poucos dias, quando viaja a Brasília por um ou dois dias. “Estão fazendo um alarme como se fosse tirar o dever constitucional do prefeito ou da vice, não é isso”, garante, apesar do texto da procuração não deixar dúvidas.
Ele rechaça a insinuação de que repassou o mandato ao secretário de Governo. “Claro que não. Isso nunca pode e nem vai acontecer”, garante.
Até a história de Odilon Ribeiro, de Aquidauana, a gente achava graça do prefeito que passava o mandato tentando inaugurar um cemitério na novela.
Agora, o enigma é desvendar quem manda em Aquidauana. E achar graça de poderes delegados por meio de procuração firmada em cartório.
O secretário de Governo foi procurado, mas não foi localizado para se manifestar sobre a polêmica.