Na esperança de repetir a história de grandes investigações de corrupção anuladas em instâncias superiores, o ex-secretário de Obras, Edson Giroto, apostou no foro privilegiado, quando era deputado federal, para anular todas as ações da Operação Lama Asfáltica no Supremo Tribunal Federal. Ele teme ser preso novamente. No entanto, a estratégia, por hora, não deu certo.
Iniciada em maio de 2013, ainda com a denominação de Operação Pilar de Pedra, a Operação Lama Asfáltica não foi concluída pela Polícia Federal, mas já vem dando trabalho para os advogados dos acusados. Além de seis ações penais na Justiça Federal, o grupo responde 27 ações civis por improbidade administrativa e oito ações criminais na Justiça Estadual.
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Os números não deixam dúvidas do escândalo. Graças ao compartilhamento de provas, o MPE (Ministério Público Estadual) denunciou 180 pessoas e 39 empresas envolvidas nos escândalo. Houve pedido de bloqueio de R$ 2,090 bilhões, sendo que a Justiça estadual já decretou a indisponibilidade de R$ 314 milhões.
Na Justiça Federal foram três liminares decretando o bloqueio de R$ 303 milhões e seis ações penais, inclusive contra o ex-governador André Puccinelli (MDB), presidente regional da sigla e pré-candidato a governador nas eleições deste ano.
Para anular todas essas ações, que tramitam na 3ª e 5ª Varas Federais e nas 1ª e 2ª Varas de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, nas 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Varas Criminais e na 2ª Vara do Tribunal do Juri, Giroto ingressou com reclamação no STF em abril do ano passado.
No mesmo período, ele ingressou com ação semelhante no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, onde alega perseguição política do MPE, falhas na interpretação dos promotores sobre as conversas interceptadas com autorização judicial e na jurisprudência de que gestor público não pode ser responsabilizado por atos de subordinados. A ação segue parada desde junho do ano passado.
No Supremo, a alegação foi outra. O ex-secretário alega que tinha foro privilegiado como deputado federal, mandato de 2011 a 2014. A investigação começou em maio de 2013. Ao constatar o envolvimento do parlamentar, a PF encaminhou o inquérito ao STF, onde foi relatado pela ministra Cármem Lúcia, atual presidente.
A magistrada determinou o desmembramento, com o seguimento da investigação contra Giroto no STF e os demais na primeira instância. O advogado Valeriano Fontoura alega que a determinação não foi respeitada e a 5ª Vara Federal, sob o comando do juiz Dalton Kita Conrado, usurpou a competência do Supremo ao validar a investigação mesmo com alguns dos envolvidos gravados em conversa com o então deputado.
Giroto acusa a PF de juntar aos autos provas colhidas no período em que ele tinha foro privilegiado e não poderia ser investigado sem o crivo do STF. A defesa cita o artigo 102 da Constituição Federal para repisar que, mesmo licenciado para ser secretário, ele tinha direito ao foro especial.
No pedido, ele pede a suspensão de todas as ações cíveis e criminais que surgiram a partir das investigações feitas pela Lama Asfáltica da Polícia Federal.
“Sob o ângulo do risco, alude à tramitação de demandas instruídas com provas obtidas de moto ilegítimo, mediante ofensa à Constituição Federal, existindo risco de prisão”, frisou a defesa.
No entanto, o ministro Marco Aurélio indeferiu o pedido em setembro do ano passado. Na ocasião, ele destacou que Giroto não tem mais foro privilegiado por não ser deputado. Ele optou por não disputar um novo mandato eletivo em 2014.
Marco Aurélio é o relator do habeas corpus, concedido em meados de 2016, que soltou Giroto e João Amorim, presos na Operação Fazendas de Lama em maio daquele ano. O mérito deverá ser julgado neste mês e ambos correm o risco de serem presos novamente se a 2ª Turma contraria o voto do relator e negar o benefício.
A Justiça brasileira tem precedente sobre anulação de grandes operações de combate à corrupção. Em 2011, o Superior Tribunal de Justiça anulou a Operação Castelo de Areia, que investigava corrupção envolvendo a construtora Camargo Corrêa e políticos poderosos, como o atual presidente Michel Temer (MDB), o ministro das Comunições, Gilberto Kassab, o ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, o presidente da Fiesp, Paulo Skaff, e o ex-ministro Antônio Pallocci.
No mesmo ano, o STJ também anulou a Operação Satiagraha, que levou à prisão em 2008, o banqueiro Daniel Dantas, e apurava esquema de corrupção envolvendo conselheiros do Tribunal de Contas de São Paulo.
Esta operação teve um desfecho ainda mais trágico. O delegado Protógenes Queiroz, que chegou a ser eleito deputado federal pelo PSOL, foi condenado a dois anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal pelas irregularidades cometidas nesta investigação.
O STJ ainda anulou a Operação Faktor, famosa Boi de Barrica, que apurava esquema de corrupção envolvendo a família Sarney no Maranhão. A corte anulou as provas porque teriam sido coletadas de forma ilegal.
Somente com o fim da impunidade, a corrupção pode deixar de ser uma prática na política brasileira.
Por enquanto, a decisão do STF respalda o trabalho dos investigadores da PF. As coisas estão mudando no Brasil, de uma forma muito lenta, é verdade, tão devagar que chega a desanimar.
Melhor do que nada, apostando no otimismo do dia.