Os servidores municipais da área de saúde foram obrigados a avisar com antecedência de 24 horas que iriam faltar ao serviço por motivo de doença. Além disso, os atestados médicos só terão validade se forem conferidos em 48h por um servidor administrativo ou mirim da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde). As medidas foram adotadas com a finalidade de reduzir o grande número de faltas de trabalhadores da enfermagem e médicos nos postos de saúde.
Essas determinações estavam previstas em uma circular do ano passado, mas que foi suspensa na quinta-feira pela Justiça. Nesta segunda-feira, o secretário municipal de Saúde, Marcelo Luiz Brandão Vilela, baixou uma resolução com as mesmas determinações, mas extinguiu o artigo que obrigava o poder de vidência por parte dos funcionários. Na prática, a estratégia procura driblar o Poder Judiciário e manter as medidas consideradas arbitrárias e ilegais.
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No dia 31 de janeiro deste ano, o Sinte/PMCG (Sindicato dos Trabalhadores Públicos em Enfermagem de Campo Grande) ingressou com ação na Justiça para pedir a suspensão da circular assinada por Vilela e pelo superintendente de Gestão de Trabalho e Educação da pasta.
A entidade alegou que não tem como o funcionário prever com um dia de antecedência que ficará doente e não terá condições de comparecer ao trabalho. “É impossível avisar que passará mal no dia seguinte”, enfatiza o advogado Márcio Almeida, que representa a entidade.
Outra determinação polêmica de Marcelo Vilela, que é médico urologista, é que o atestado só vale se for validado pela Sesau 48 horas úteis a contar da ausência. O Jacaré apurou que o servidor leva o documento até à secretaria, onde um trabalhador mirim ou da área administrativa confere e anota no livro de controle. Em seguida, o servidor deve entregar o atestado médico para o chefe imediato.
Para Almeida, há um transtorno para o funcionário, que terá gasto com locomoção até a secretaria, e para o usuário da rede pública, que será obrigado a esperar ainda mais, se for possível isso, em decorrência da ausência do trabalhador para preencher uma exigência burocrática.
Além disso, a entidade alega que o atestado está revestido de presunção de veracidade, como ato privativo do médico e é citado como motivo de abono da falta do servidor na legislação municipal.
Na quinta-feira, a juíza May Melke Amaral Penteado Siravegna, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, suspendeu a circular. “É imperioso que o exercício dos poderes administrativos seja condicionado aos limites legais, devendo ser praticado pela autoridade competente e com observância estrita do trinômio necessidade-adequação-proporcionalidade, o que não ser verifica nos documentos carreados”, frisa.
A magistrada considerou transtorno desnecessário a exigência de o servidor se deslocar em até dois dias para validar o atestado nos órgãos centrais. A liminar suspendendo a portaria foi publicada nesta segunda-feira no Diário da Justiça.
Também nesta segunda-feira, Vilela, em conjunto com a secretária municipal de Gestão, Maria das Graças Macedo, baixou a Resolução 30/2018, publicada no Diário Oficial de Campo Grande, com as mesmas determinações. O advogado do Sinte/PMCG lamentou o procedimento para burlar a ordem judicial.
Na portaria, os secretários repetem a defesa feita pela Procuradoria Geral do Município, de que as medidas foram adotadas devido ao “excesso de atestados na rede municipal de saúde”.
Outra preocupação é com os frequentes problemas na escala das unidades de saúde, que ficam sem médicos e profissionais de enfermagem em decorrência da ausência dos profissionais por motivos de saúde. A necessidade de exigir a comunicação em 24h é para permitir que outro servidor seja realocado para evitar prejuízos aos usuários do SUS (Sistema Único de Saúde). Em média, o atestado tem sido concedido por três dias.
Sobre a exigência do funcionário “validar”, os secretários justificam que é “a necessidade de controle maior pela Administração quanto ao fluxo e entrega de atestados”.
O advogado do Sinte/PMCG vai informar à magistrada sobre a nova resolução, publicada no mesmo dia da liminar, e deverá pedir a suspensão da mesma.
O alto número de funcionários da enfermagem e médicos com problemas de saúde pode parecer estranho. No entanto, por outro, deve ser extremamente desgastante ser responsável por vidas diariamente e ainda administrar o caos, a falta de leitos em hospitais, a ausência de remédios, a grande demanda nas unidades e o déficit de profissionais.
Em alguns casos, pacientes ficam internados até em centros de terapia intensiva improvisada nos centros de saúde por falta de vagas em UTI.
É preciso buscar uma solução dentro da lei, sem penalizar quem já é extremamente penalizado diante das condições atuais do serviço público de saúde.
A Secretaria de Saúde foi procurada, mas limitou-se a destacar os artigos da resolução, como a de que a exigência de comunicação deve ser feita em 24h e o atestado deve ser validado em 48h úteis.
Não houve manifestação sobre quem valida o documento, se é realmente um servidor administrativo ou um médico perito.
Vilela também não se pronunciou sobre a determinação judicial.