Estadista, homem de princípios, um dos poucos democratas sul-mato-grossenses com envergadura nacional e que construiu a carreira política ao enfrentar duas ditaduras, o ex-governador Wilson Barbosa Martins morreu, às 6h05, desta terça-feira de Carnaval, em Campo Grande.
Militante histórico do MDB, Dr. Wilson, como era chamado pelos mais próximos, construiu a carreira com a imagem de austeridade, gestor eficiente e respeito ao funcionalismo público. No entanto, ao concluir o segundo mandato como governador aos 81 anos, chamuscou esta imagem ao enfrentar greves, denúncias de corrupção e a popularidade em baixa devido ao atraso de três meses de salários e do 13º dos servidores estaduais.
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Advogado formado no Largo de São Francisco, tradicional faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Wilson Barbosa Martins nasceu em 17 de junho de 1921 na região de Campos de Vacaria, em Rio Brilhante.
De família de políticos históricos, como o tio e sogro, Vespasiano Martins (prefeito de Campo Grande, deputado federal, senador e revolucionário de 1930), e irmão de Plínio Martins (vereador, prefeito e deputado federal), ele casou-se com Nelly Martins em 1943.
Opositor da ditadura de Getúlio Vargas em 1943, ele foi um dos fundadores da UDN, partido pelo qual disputou a Prefeitura de Campo Grande pela primeira vez. Na única derrota, em 1946, ele perdeu para Ary Coelho de Oliveira (PTB), que acabou assassinado dois anos depois em Cuiabá, então capital do Mato Grosso uno.
O primeiro cargo público foi como secretário geral da prefeitura na gestão de Fernando Corrêa da Costa.
Em 1958, eleito prefeito de Campo Grande, começa a construir a carreira de gestor eficiente e austero, ao organizar o cadastro imobiliário, a cobrança de tributos e a previdência social. Ganhou fama nacional como um dos cinco melhores prefeitos do Brasil na época.
Em 1962, elegeu-se deputado federal e passou a integrar o grupo denominado Bossa Nova, que debatia as mudanças propostas pelo presidente João Goulart, o Jango. Com o golpe militar em 1964, fez oposição e foi reeleito deputado federal em 1966.
Wilson foi cassado e teve os direitos políticos suspensos pelo AI-5 (Ato Institucional) por dez anos. Neste período, dedicou-se à advocacia. Eleito presidente da OAB/MS, passou a defender presos políticos.
Após recuperar os direitos políticos, ele “refundou” o PMDB e acabou sendo candidato a governador em 1982, no lugar do irmão, Plínio Barbosa, que não aceitou o desafio apesar do favoritismo.
Primeiro governador eleito pelo voto direto de Mato Grosso do Sul, Wilson Martins fez história com política de valorização dos servidores. Contudo, apesar de não ter a fama de obreiro do principal adversário, o ex-governador Pedro Pedrossian, ele realizou obras fundamentais para o desenvolvimento do Estado, como a pavimentação de 2,5 mil quilômetros de rodovia, inclusive a BR-262, entre Corumbá e Três Lagoas, e a BR-163, entre Dourados e a divisa com o Paraná.
Participou ativamente da campanha das Diretas-Já ao lado de grandes personagens da política nacional e amigos, como Ulisses Guimarães e Mário Covas, e renuncia ao cargo de governador para disputar o Senado em 1986. Eleito senador, tornou-se um dos responsáveis pela Constituinte de 1988.
Oito anos depois, Wilson Barbosa Martins volta a ser eleito governador do Estado e, pela segunda vez, sucede Pedrossian.
Assume um legado de obras não concluídas, como os parques Ayrton Sena, Jacques da Luz e das Nações, o Hospital Regional, a Parque do Produtor (atual Shopping Norte Sul), o Fórum de Campo Grande, o Tribunal de Contas e a nova rodoviária da Capital (não concluída até hoje).
Além de não concluir as obras o antecessor, que procurou desgastar com placas anunciando a falta de dinheiro, Wilson Martins teve a gestão marcada por crises.
Em 1995, teve a greve dos servidores do Poder Judiciário e ação de seis juízes que bloqueou as contas estaduais para garantir o reajuste dos salários.
Em 1996, Wilson apoia o fim da estabilidade no serviço público e a primeira reforma polêmica da previdência, proposta por Fernando Henrique Cardoso.
Com os salários do funcionalismo atrasados, ele fecha o acordo da dívida com a União, que compromete 15% da receita estadual com o pagamento dos juros até os dias atuais. No início do ano seguinte, apoiou a aprovação da emenda que previa a reeleição para os ocupantes de cargos executivos.
Em junho de 1997, enfrentou o aquartelamento da Polícia Militar, que durou cinco dias e precisou da intervenção das Forças Armadas.
Em novembro daquele ano, o governador autorizou a venda da Enersul por R$ 625,55 milhões. O Estado ficou com R$ 250,22 milhões, correspondente a 40% das ações na concessionária, e usou o dinheiro para quitar salários e a dívida com a União.
Em 1998, o ex-secretário Aleixo Paraguassu acusou o Governo de não investir os 25% previstos pela Constituição em educação. Ele ainda foi acusado de causar prejuízos aos cofres estaduais ao pagar R$ 75 milhões para a Andrade Gutierrez.
Apesar de ter usado a máquina estadual em favor do candidato governista, ele não conseguiu eleger o sucessor, o então secretário estadual de Fazenda, Ricardo Bacha. Acuado pelo atraso no pagamento de salários dos servidores, que não recebiam há três meses, não compareceu à transmissão do cargo ao sucessor, Zeca do PT.
Wilson Barbosa Martins manteve-se no PMDB, que retornou ao antigo nome MDB neste ano. No ano passado, devido estar acamado, não participou das celebrações do centenário.
Antítese de Pedrossian, não tinha o hábito de cultuar a própria personalidade. A filha e a esposa só foram homenageadas com nominações de próprios públicos após a morte.
A esposa Nelly Martins, com quem foi casado por 60 anos, deu nome a parte da Via Parque, uma das avenidas mais lindas de Campo Grande.
A filha, Celina Jallad, que foi deputada estadual e conselheira do Tribunal de Contas, deu nome a um conjunto residencial popular.
Um político humano, Wilson Barbosa Martins deve receber postumamente as homenagens, merecidas, mas que nunca buscou em vida, por ser o estadista e político de princípios que sempre foi.
Velório será no Centro de Convenções
O velório do ex-governador Wilson Barbosa Martins será a partir das 15h no Centro de Convenções Rubens Gil. O sepultamento está prevista para as 10h desta quarta-feira no Cemitério Parque das Primaveras.
O governador Reinaldo Azambuja (PSDB) lamentou a morte e decretou luto oficial por três dias.
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