O contribuinte tem o direito constitucional de recorrer à Justiça para cobrar prejuízos causados pelos buracos nas ruas e avenidas de Campo Grande, que segue com o território semelhante ao da lua ou queijo suíço. O transtorno também é comum nas rodovias estaduais e federais. No ano passado, a Justiça Federal condenou o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) a pagar indenização de R$ 165 mil a uma família que perdeu o patriarca em acidente causado por buraco.
Desde a gestão de Alcides Bernal (PP), que atribui ao boicote dos vereadores e do Tribunal de Contas para lhe causar desgaste, a buraqueira é um pesadelo em Campo Grande. Marquinhos Trad (PSD) e Reinaldo Azambuja (PSDB) não colocaram fim a praga nem torrando R$ 24,3 milhões, pago a sete empresas “amigas” e contratadas sem licitação, no início do ano passado.
No final do ano passado, o prefeito contratou sete empresas, inclusive algumas denunciadas por prestar serviço péssimo e beneficiadas por suposta fraude na gestão do irmão, Nelsinho Trad (PTB), mas não acabou como pesadelo diário do campo-grandense. Os buracos seguem causando prejuízos para quem usa o carro para sair de casa para trabalhar ou até mesmo ter momentos de lazer.
Só fica no prejuízo quem quer. Pela Constituição Federal, o poder público é responsável pela manutenção das vias públicas. Afinal, ninguém faz o papel de idiota de pagar o IPTU altíssimo e ficar sem nenhuma contrapartida.
“O poder público responde objetivamente pela conservação das vias públicas”, atesta a advogada Jacqueline Hildebrand Romero, que conta com mais de 10 ações na Justiça. A maior parte dos clientes é de motociclistas feridos em acidentes causados por buracos. Em média, os pedidos são de R$ 2 mil a R$ 3 mil por danos morais.
Um motociclista ganhou a ação, no final do ano passado, que determina a prefeitura a pagar R$ 3 mil de indenização moral e R$ 2,5 mil de danos materiais.
Outro cliente pedirá indenização maior porque fraturou os dois braços ao desviar de um buraco e colidir a motocicleta em um morro de pedras na Avenida Lúdio Martins Coelho.
O advogado André Luiz Godoy concorda que o proprietário do veículo tem direito a indenização. “Se o motorista estava trafegando em velocidade condizente com a da via e não teve como desviar do buraco, bateu e teve prejuízos, ele tem direito ao ressarcimento do prejuízo”, frisa.
Os advogados orientam que o condutor deve fazer fotografias do buraco, da via, do endereço e registrar boletim de ocorrência. Caso o prejuízo seja irrisório, por exemplo, só os pneus, o condutor poderá fazer o pedido de ressarcimento direto no Juizado Especial, no Centro, ou poderá ingressar com ação mediante um advogado.
Em Campo Grande, os buracos nas ruas estão causando até acidentes com mortes. Na noite de 5 de dezembro do ano passado, oito meses após o fim do prazo dado prefeito Marquinhos Trad para acabar com a buraqueira nas ruas, o motociclista Cícero Alves Dantas, 53 anos, morreu em acidente na Avenida Gury Marques, na saída para São Paulo.
Ele foi desviar um buraco, que surge a cada chuva na avenida, e bateu em um veículo estacionado. O carro estava parado porque dois pneus estouraram no mesmo buraco.
Como pedir ressarcimento na Justiça
Caiu em um buraco e está disposto a ser ressarcido, siga as dicas:
- fotografe os estragos causados no veículo, o buraco, a via, o endereço e referências próximas
- reúna notas fiscais dos gastos causados pelo acidente
- se houve dano material, reúna três orçamentos para convencer o juiz de que o valor não é absurdo
- anexe todos os comprovantes de despesas com médicos e remédios
- se for autônomo, sem registro em carteira, pode cobrar danos morais pelo tempo que ficar parado
- pode entrar diretamente no Centro Integrado da Justiça, na Rua 7 de Setembro, 174, no Centro. Fone: 3317-8600
- Ou poderá contratar uma advogado
Mesmo não perdendo a vida, muitos motoristas chegam a ter prejuízos vultuosos nas vias da Capital, que chegam a R$ 7 mil, considerando-se os gastos apenas para consertar os veículos.
No caso de acidente com vítima fatal, cabe indenização aos familiares. “A indenização consiste, simplesmente, no único mecanismo possível de satisfação jurídica para os casos de danos irreparáveis, como na hipótese de perda de um ente querido”, observou o juiz de Coxim, em sentença contra o DNIT.
E com a temporada de chuvas, apesar dos assessores exaltarem a operação tapa-buracos de Marquinhos, vias públicas seguem exigindo paciência e habilidade dos motoristas, inclusive dos que pagam os impostos em dia.
Justiça federal manda DNIT indenizar viúva e filhas por causa de buraco
A Justiça Federal condenou o DNIT, em sentença publicada em 12 de dezembro passado, a pagar pensão mensal e indenização por danos morais a viúva e duas filhas de José Silvério Filho, morto em acidente causado por buraco na BR-163, em Sonora.
Conforme a ação, ele trafegava em um Ford Focus e ao desviar de buraco – com 2,5 metros de comprimento, 80 centímetros de largura e 10cm de profundidade –bateu em um caminhão Scania. O carro ficou totalmente destruído e Silvério morreu.
“Restou suficientemente evidenciada a negligência (culpa stricto sensu) do réu DNIT no cumprimento de seu dever legal de proporcionar perfeitas condições de trafegabilidade na rodovia federal em que ocorrido o acidente que vitimou o marido/pai das autoras”, observou o magistrado.
“Como sabido, o art. 37, 6º da Constituição Federal, consagrando a “teoria do risco administrativo”, instituiu, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros (em oposição à tradicional responsabilidade subjetiva, que depende da demonstração de culpa [imprudência, negligência ou imperícia] do causador do dano)”, frisou.
Ele condenou o órgão federal a pagar pensão mensal de 2/3 do salário mínimo a viúva, Neci Rodrigues Lima, de 8 de abril de 2014, quando ocorreu a tragédia, até 2031. Além disso, o DNIT deverá pagar indenização por danos morais de R$ 65 mil a Neci e R$ 40 mil a cada filha, Andréia Lima Silvério de Souza, e Adriana Lima Silvério. Também deverá arcar com o ressarcimento de R$ 15,5 mil, valor do carro.
O Governo poderá recorrer e os valores só serão pagos quando a sentença transitar em julgado. Mas não deixa de ser uma esperança no Brasil, onde a população só tem a obrigação de pagar mais impostos, mas ninguém faz nada para por fim a precariedade do serviço público.