Na delação premiada homologada pela Justiça, o empresário Ivanildo da Cunha Miranda, que foi operador financeiro das campanhas do PMDB em Mato Grosso do Sul, revelou que quatro frigoríficos pagavam propina ao ex-governador André Puccinelli (PMDB). Entre 2006 e 2013, ele revelou que os valores variaram entre R$ 400 mil e R$ 2 milhões.
As revelações constam da delação premiada homologada pelo juiz federal substituto Ney Gustavo Paes de Andrade, da 3ª Vara Federal de Campo Grande, e que desencadearam a Operação Papiros de Lama, denominação da 5ª fase da Lama Asfáltica.
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Na delação, Ivanildo conta que o dono da JBS, Joesley Batista, preso em Brasília (DF), fez o primeiro contato com Puccinelli na campanha para governador do Estado em 2006. Na época, a empresa repassou R$ 500 mil por fora e em dinheiro em espécie.
O dinheiro foi entregue a Ivanildo, que foi o responsável financeiro pela campanha do peemedebista. Ele contou que foi de avião buscar o dinheiro em São Paulo e as cédulas foram entregues em uma caixa de papelão.
De confiança de Puccinelli, ele contou que passou a recolher o dinheiro pago pelos frigoríficos Bertin, Independência, Marfrig e JBS. Na narrativa contada ao Ministério Público Federal e à PF, o empresário diz que recebia de R$ 60 mil a R$ 80 mil por mês para fazer a coleta e entregar o dinheiro ao ex-governador. Nesta época, o repasse ao peemedebista seria de R$ 300 mil a R$ 400 mil.
Depois de 2010, quando a JBS se transformou na gigante do setor e a maior produtora de carne do mundo, o montante da propina teve salto significativo, com o valor mensal passando a oscilar entre R$ 1,8 milhão e R$ 2 milhões.
Ivanildo apresentou a versão de que só em 2009, por meio de um e-mail do executivo Valdir Boni Miranda, descobriu que a propina era paga em troca dos incentivos fiscais.
O pagamento das vantagens indevidas ocorreu em decorrência dos incentivos fiscais concedidos por meio dos termos assinados em 2007, 2011, 2013 e 2014.
Em praticamente todas as ocasiões, o dinheiro era entregue em sacolas ou caixas de papelão de arquivo. O empresário marcava com a secretária do então governador, Mara Bertaglinhori, e realizava a entrega no apartamento de Puccinelli, no Jardim dos Estados, sempre por volta ds 6h da manhã.
O ex-governador o recebia sozinho e só permitia acesso da empregada para servir café e água. Em seguida, quando a grana era entregue em caixas, ele mesmo passava fita crepe e as guardas. As sacolas eram deixadas no apartamento e nunca foram devolvidas ao delator.
Ele contou que só entregue uma vez na Governadoria para Mara. Na ocasião, o dinheiro foi conferido por Marcos Perez, o Marquito, que teria constatado a falta de R$ 1,5 mil. A diença acabou sendo entregue em outra oportunidade.
Em 2012, Joesley prometeu repassar R$ 20 milhões para o ex-governador. O dinheiro foi repassado de duas maneiras, metade como doação oficial e R$ 10 milhões em espécie.
Esta quantia foi entregue a Ivanildo em São Paulo, após três dias para serem recolhidos.
Quando tinha dificuldade, a JBS usava notas fiscais frias e doleiros para fazer o pagamento da propina.
De acordo com o delator, os depósitos foram feitos na sua conta, da sua cervejaria, Força Nova, do Bate Forte, atacadista do Grupo Pereira, Germinas e João Barisson.
Outros dois delatores, Demilton Antônio de Castro, funcionário por mais de 40 anos da JBS, e executivo Valdir Aparecido Boni, confirmaram as informações fornecidas por Ivanildo Miranda, ainda revelaram como era a atuação do seu sucessor no esquema, o ex-secretário estadual adjunto de Fazenda, André Cance.
Na campanha de 2012, o candidato a prefeito da Capital do grupo era o ex-secretário estadual de Obras, Edson Giroto, que foi derrotado no segundo turno pelo radialista e advogado Alcides Bernal (PP.
Em 2014, quando foram repassados R$ 20 milhões, o candidato do grupo era o ex-prefeito Nelsinho Trad (PTB), que ficou em terceiro na disputa. No entanto, o ex-prefeito não é citado nem foi alvo da operação.
Naquele ano, Reinaldo Azambuja (PSDB) venceu o franco favorito Delcídio do Amaral, na época senador pelo PT. O tucano manteve o esquema e teria recebido R$ 38,4 milhões em propinas, segundo a JBS. Ele é investigado pela denúncia no STJ.
Nos questionamentos ao delator, é visível o esforço dos delegados e procuradores em não citar o tucano, que tem foro privilegiado. Eles sempre frisam que o alvo do questionamento é Puccinelli e sua gestão de 2007 a 2014.
Um deputado federal é citado na delação, mas o juiz não enviou o caso para o STF porque ele já é investigado pela corte após as revelações feitas na delação da JBS.