A greve dos médicos, prevista para começar nesta segunda-feira, revela o estilo do prefeito Marquinhos Trad (PSD) no tratamento dispensado aos servidores municipais. Ele tem muitas semelhanças com o jeito de Gilmar Olarte: ambos negam o reajuste com a ameaça de que pode faltar dinheiro para pagar os salários em dia e enquanto fazem reuniões oficiais com sindicalistas, comandam guerra cibernética e nos jornais para destruir a reputação dos dirigentes.
Por outro lado, o prefeito autorizou reajustes milionários nos contratos de quatro empresas com a Secretaria Municipal de Saúde. Só na sexta-feira, autorizou aumento de 25%, que representou o desembolso a maior de aproximadamente R$ 5 milhões.
Os médicos realizaram a primeira greve em 2015, na gestão de Olarte. Apesar das ameaças do então chefe do Executivo e de ações na Justiça, os médicos suspenderam o atendimento em maio e retornaram após acordo fechado com a intermediação dos promotores de Justiça estadual e do Trabalho. No entanto, o acordo não foi cumprido e a categoria iniciou nova paralisação em agosto.
Agora, dois anos depois, os médicos aprovaram novamente greve. As negociações não avançaram e os profissionais decidiram radicalizar porque estão sem reajuste há três anos. Eles querem aumento de 27% sobre o piso de R$ 2.516.
Sem acordo, Marquinhos – assim como Olarte – recorreu à Justiça para intimidar os profissionais e cancelar a greve, que deve agravar o caos na saúde pública. O juiz prevê multa de R$ 10 mil em caso de descumprimento.
O presidente do Sindicato dos Médicos de Campo Grande, Flávio Freitas Barbosa, disse que a paralisação só não começa se o mundo acabar. Como a vida segue normal, a paralisação começou hoje.
Indignado pelo fracasso da estratégia inicial, assim como Olarte, Marquinhos partiu para o ataque contra o sindicalista. Assessores divulgaram o salário pago ao médico, que teria recebido mais de R$ 160 mil neste ano.
No entanto, ele cumpriu expediente, enquanto o secretário municipal de Saúde, Marcelo Vilela, ganhou R$ 90,5 mil do Hospital Regional sem trabalhar uma única hora. Para evitar que o “amigo” desembolsasse um tostão após ser notificado pelo Estado para devolver o dinheiro, o prefeito resolveu usar o ICMS repassado ao município para quitar a dívida do secretário. Ou seja, usou o dinheiro do contribuinte. Marcelo tem três vínculos empregatícios.
Olarte divulgou os salários dos médicos e dos professores como forma de colocar a opinião pública contra os grevistas. Ele chegou a divulgar de forma equivocada o salário do presidente da ACP, na época, Geraldo Gonçalves, e ainda disponibilizou na internet a folha de pagamento do magistério.
A equipe de Marquinhos não poupa nem os aliados. A retirada do projeto que incorpora os abonos e gratificações da enfermagem causou a indignação da categoria. Aliás, a retirada foi uma trapalhada da Executivo, que enviou a proposta e só depois viu que “não tinha o dinheiro”. Os profissionais fizeram protesto no Paço Municipal.
Enquanto Trad conversava com uma comissão, os assessores faziam guerrilha virtual para atacar o vereador Enfermeiro Fritz, a secretária municipal adjunta de Saúde, Andressa de Lucca, e o marqueteiro da campanha vitoriosa de Marquinhos, Gildo Andrade. Nos grupos de whatsapp, no Facebook e nos jornais de guerra, eles divulgavam o salário do marqueteiro, que ganha R$ 16 mil na gestão de Reinaldo, e de Andressa, que é enfermeira.
Enquanto garante supersalários aos assessores e derrotados nas urnas, como o ex-prefeito de Naviraí, Leo Matos, que ganha R$ 12 mil, Marquinhos faz guerra contra quem toca a máquina, sofre as consequências da turbulência política e é responsável pelo atendimento à população.
Com a falta de diálogo por parte do prefeito, que não chegou a acordo com os médicos, que tinham data base em maio e continuam sem reajuste desde 2014, a conta vai sobrar para quem depende do atendimento nos postos de saúde.
No entanto, o Diário Oficial do Município revela que o problema não é falta de dinheiro, mas as prioridades de Marquinhos. Só na sexta-feira, ele divulgou a renovação de quatro contratos na saúde que tiveram termos aditivos.
O contrato de menor valor, com a S. H. Informática, foi firmado no dia 23 de maio e divulgado um mês depois, prevê acréscimo de R$ 349,3 mil, elevando o contrato anual para R$ 1,954 milhão.
Outros três foram assinados no dia 3 de abril deste ano, são mais vultuosos e não trazem o valor inicial nem o acréscimo. Só a anotação de que tiveram correção de 25%. O Jacaré estima que cada contrato teve acréscimo de R$ 1,5 milhão.
Com o 3º termo aditivo, a Clínica de Doenças Renais vai passar a receber R$ 7,728 milhões do município. A empresa é de Maria Aparecida Albuquerque Arroyo, esposa do ex-deputado estadual Antônio Carlos Arroyo (PR).
O mesmo benefício foi concedido outras duas empresas, Med Rim (R$ 7,728 milhões) e SIN – Serviços Médicos Integrados em Nefrologia (R$ 7,728 milhões). Os contratos são da mesma data, 4 de março de 2015, e todos foram firmados na gestão de Gilmar Olarte, outra coincidência.
Já para os profissionais da saúde, Marquinhos usa as armas que dispõe, a mídia e o Poder Judiciário, enquanto o povo, ah, o povo só vai votar em 2020.