A Força-Tarefa do MPE (Ministério Público Estadual) concluiu ter encontrado indícios de que ex-prefeito de Campo Grande, Nelsinho Trad, e o ex-secretário municipal de Infraestrutura, João Antônio De Marco, montaram sofisticado esquema criminoso para desviar recursos públicos por meio da operação tapa-buracos. Só nos contratos firmados com a LD Construções teriam sido superfaturados R$ 26,5 milhões dos R$ 28,398 milhões pagos pelo município entre 2010 e 2015.
Para garantir o ressarcimento dos cofres públicos pelo esquema de corrupção, cinco promotores ingressaram com ação civil pública em que pedem a condenação da dupla, mais 21 pessoas e cinco empresas ao pagamento de R$ 369 milhões, sendo R$ 28,3 milhões pelo ressarcimento dos valores pagos à LD Construções (com a anulação dos contratos ilegais), multa civil de R$ 56,7 milhões e indenização por danos morais coletivos de R$ 283,8 milhões (equivalente a dez vezes o valor desviado).
Os réus nesta segunda ação civil por improbidade administrativa são:
- 1 – Almir Antônio Diniz de Figueiredo
- 2- André Luiz Scaff
- 3 – Arnaldo Angel Zelada Cafure
- 4 – Bertholdo Figueiró Filho
- 5- Cleber de Oliveira
- 6- Elias Lino da Silva
- 7 -Fátima Rosa Cota Moral de Oliveira
- 8 – Gilmar Antunes Olarte (ex-prefeito)
- 9 – Ivane Vanzella
- 10 – João Antônio de Marco
- 11 – João Parron Maria
- 12 – Lucas Potrich Dolzan
- 13 – Luciano Potrich Dolzan
- 14 – Neli Hatsuco Oshiro
- 15 – Marcela Lima Cunha
- 16 – Michel Issa Filho
- 17 – Múcio José Ramos
- 18 -Nelson Trad Filho (ex-prefeito)
- 19 – Paulo Roberto Alvares Ferreira
- 20 – Semy Alvez Ferraz
- 21 – Sylvio Darilson Cesco
- 22 – Valtemir Alves de Brito
- 23 – Therezinha Azambuja Ferreira
As empresas denunciadas
- 1 – Asfaltec Tecnologia em Asfalto Ltda.
- 2 – Equipe Engenharia Ltda.
- 3 – LD Construções Ltda.
- 4 – Unipav Engenharia Ltda.
- 5 – Usimix Ltda.
Bem fundamentada em 247 páginas, a ação desvenda o suposto esquema de corrupção e relaciona ao grupo aos últimos dois grandes escândalos de corrupção na história de Mato Grosso do Sul. O primeiro é a Operação Uragano, que levou a prisão do então prefeito de Dourados, Ari Artuzi, já morto e único condenado na denúncia de pagamento de mensalão para autoridades, políticos e integrantes dos três poderes. O segundo é Operação Lama Asfáltica, ainda em fase de investigação.
De acordo com a denúncia, o esquema foi montado por Nelsinho, De Marco, o ex-diretor de manutenção de vias públicas, João Parron Maria, o ex-chefe de Divisão de Manutenção de Vias Pavimentadas, Sylvio Cesco, e o ex-diretor geral da Central Municipal de Compras, Bertholdo Figueiró.
As licitações da tapa buraco eram feitas sem qualquer levantamento, estudo de engenharia e projeto básico. Ao Tribunal de Contas do Estado, Sylvio revelou que usava o “chute” para definir a quantidade de lama asfáltica usada e a área a ser coberta pela operação. A forma de pagamento também era curiosa, já que o valor era definido entre o secretário e a empreiteira e não base nas medições feitas pelos fiscais.
Os promotores descobriram que eles não iam para a rua conferir a execução do serviço, mas assinavam as medições de dentro do gabinete.
Aliás, o grupo começava a montar o esquema na licitação. Só poderiam participar empresas que forneciam o CBQU ou apresentavam atestado de anuência de terceiro em fornecer o material.
Bertholdo Figueiró admitiu, em depoimento ao MPE, o direcionamento. Ele justificou que o objetivo era para eliminar eventuais aventureiros, ou melhor explicando, alguém que não fizesse parte do esquema.
Em decorrência deste critério, de que a empresa deveria estar localizada a, no máximo, 50 quilômetros da Capital, a Usimix forneceu o CBQU em 19 dos 30 contratos. A Asfaltec estava em outros seis. As duas puderam escolher quem faria a operação tapa buraco na Capital.
A LD Construções é uma das sócias da Solurb, a concessionária do lixo na Capital, que ganhou a licitação em outubro de 2012, no encerramento do mandato de Nelsinho Trad como prefeito.
O dono da empresa é Luciano Potrick Dolzan, casado com Ana Paula, genro de João Amorim, e, na época dos fatos, cunhado de Nelsinho Trad.
A LD foi contratada para realizar a operação tapa buracos nos bairros Aero Rancho e Guanandi, mesma área em que foi contatada a Gradual Engenharia.
Além de não executar o serviço, a empresa cobrou valores superfaturados em 88%, conforme a investigação.
Esta é a segunda ação de improbidade contra Nelsinho em decorrência de suposta fraude na operação tapa buraco. Em outra, ele já está bens indisponíveis por causa de fraude de R$ 7,066 milhões nos contratos firmados com a Proteco, do sogro de Luciano Dolzan.
Sobre a nova denúncia, Nelsinho Trad destacou que não teve conhecimento da ação. “Assim que for intimado, irei provar sua total improcedência”, garantiu o ex-prefeito, que sonha em ser senador, mas terá muita dificuldade em decorrência da ofensiva do MPE.
Confira trechos da denúncia feita no dia 6 pelos promotores
“As sequelas dos atos ímprobos são gravíssimas e se revelam, dentre outros aspectos, pela revolta social diante da situação calamitosa a que chegou a malha viária de Campo Grande.
“As quantias desviadas pelos corruptos e corruptores para satisfação de interesses não republicanos acarretam, ainda que indiretamente, prejuízos ao atendimento de necessidades primárias da sociedade, que clama por melhores condições de educação, saúde, segurança e estrutura de higiene sanitária.
“A corrupção de valores como os que são objeto desta ação constitui profunda violação dos direitos fundamentais individuais e sociais mais básicos que o Estado de Direito deve tutelar.
“A corrupção – nos moldes apurados e descritos – coloca em risco o regime republicano e democrático ao criar uma pauta de motivações e finalidades privadas na condução da coisa pública.
“Mais ainda, a corrupção se expande, horizontal e verticalmente, uma vez que a corrupção na Secretaria Municipal de Infraestrutura, Transporte e Habitação incentiva que as mesmas empresas que ali corrompem busquem a expansão do seu universo de benefícios mediante a corrupção de outras autoridades.
“Incentiva também que outras empresas corrompam para obter os mesmos benefícios. E, ainda, um mau exemplo da cúpula da Administração Pública para os demais estratos sociais, reforçando uma cultura de corrupção e embasando racionalizações que conduzem a elisão e evasão fiscais.
“Merece destaque que, além de serem recorrentes as notícias de que os cidadãos têm de se socorrer de oficinas mecânicas para fazer reparos em seus veículos, danificados pela péssima qualidade das vias públicas, noticia-seque os buracos também contribuem para a ocorrência de acidentes de trânsito, inclusive com vítimas fatais (f. 443-518).”