O Supremo Tribunal Federal vetou censura às novas mídias e impôs derrota história ao Ministério Público Estadual e ao TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul). Nesta quarta-feira, quando se comemora o Dia da Liberdade de Imprensa, o ministro Dias Toffoli suspendeu a liminar que determinava a retirada do “Blog do Nélio” do ar sob pena de prisão do jornalista Nélio Raul Brandão, que deixou a TV Morena para se dedicar ao jornalista independente e investigativo.
Para acatar o pedido do jornalista, Toffoli cita o trecho do relatório do ministro Ayres de Britto, que consagrou a liberdade de imprensa no Brasil em setembro de 2009. “Não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, inclusive a procedente do Poder Judiciário, pena de se resvalar para o espaço inconstitucional”, destaca o ministro.
A liminar freia a ação da entidade que representa os promotores e procuradores de Justiça, ASMPMS (Associação Sul-mato-grossense dos Membros do Ministério Público), que tinha o objetivo declarado de só permitir notícias boas e positivas para o órgão. Com todos os integrantes ganhando supersalários, acima do teto constitucional, a entidade decidiu concentrar os esforços em calar blogs e a imprensa independente.
O presidente da ASMPMS, Lindomar Tiago Rodrigues, defendeu a censura em nota. “A decisão é drástica e certamente poderá incomodar outros setores da ‘imprensa marrom’, que continuará a usar as armas que têm, motivados por interesses escusos”, afirmou, enaltecendo a decisão do juiz Paulo Afonso de Oliveira, da 2ª Vara Cível de Campo Grande.
Não é o que pensa o ministro do STF sobre os blogs. “Estamos na Era das Novas Mídias. Essa nova realidade revolucionou os nossos hábitos e, inevitavelmente, as formas de jornalismo. Mudou-se o suporte, mas não o fim maior, a informação”, frisou Dias Toffoli, dando uma aula para os magistrados e promotores de Mato Grosso do Sul, de como devem proceder nos novos tempos e se somar aos esforços para se construir a nação mais cidadão e civilizada.
Toffoli não isenta o jornalista de responder pelas reportagens e por eventual dano à honra. Só não concordou com a iniciativa da entidade presidida por Lindomar, que planejava proibir qualquer menção aos integrantes do MPE.
Nélio Brandão vinha publicando matérias denunciando os gastos do procurador geral de Justiça, Paulo Cezar dos Passos. No entanto, as falhas do órgão não é exposta somente pelo jornalista ou pela imprensa nova, que tanto desgosto vem causando aos promotores.
Ontem, o Campo Grande News publicou matéria destacando que uma quadrilha acusada de roubo de três bancos foi solta pela Justiça por falha do promotor Rogério Augusto Calábria de Araújo. Ele não denunciou os envolvidos no prazo e a juíza Eucélia Moreira Cassal, da 3ª Vara Criminal, determinou a soltura dos quatro suspeitos.
Aliás, a conduta dos magistrados também é questionada na ação proposta por Nélio no STF. Ele denunciou que o juiz Paulo Afonso de Oliveira foi exonerado da função de juiz auxiliar da presidência do TJMS no dia 4 de fevereiro deste ano, no mesmo dia em que a ASMPMS protocolou o pedido para suspender o “Blog do Nélio”.
No dia 6, dois dias depois, o magistrado concedeu a liminar, determinando a retirada do blog do ar ou a prisão do jornalista. No mesmo dia, ele voltou a ocupar a função no Tribunal de Justiça.
Em resposta ao questionamento do ministro do Supremo, Oliveira alegou que não deixou a 2ª Vara Cível, mas passou a acumular os cargos por determinação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Toffoli apenas citou a história e não se manifestou a respeito na liminar concedida ontem.
Para o jornalista Nélio Brandão, a decisão é vitória da sociedade sul-mato-grossense, que “está farta de mal utilização do dinheiro público”. “A decisão do ministro ratifica que a imprensa tem que cumprir seu papel”, frisa.
“Falamos de homens públicos que, por sinal, ganham salário mensal que um trabalhador comum levaria décadas para receber, portanto, devem fazer o seu melhor, com lisura, sem conchavos ou interesses pessoais”, alertou.
Após a decisão do STF, ele garante que terá mais tranquilidade para trabalhar, mas não mudará uma linha na conduta adotada até o momento. “Os homens públicos com caráter duvidoso não suportam sites como o nosso, porque uma vez desmascarados, sempre estarão em dívida com a sociedade, seus falsos juramentos, o que vão dizer lá me casa”, ressalta.
Toffoli cita frase de 1968 do juiz Hugo Lafayette Black, da Suprema Corte dos Estados Unidos, para destacar a importância da liberdade de imprensa. “Não nos deveríamos jamais esquecer de que a linguagem clara da Constituição reconhece ser a censura inimiga mortal da liberdade e do progresso, e de que a Constituição a proíbe”, já dizia o magistrado americano há 49 anos.
AQUI você pode conferir na íntegra o voto de Dias Toffoli.